Impostos e sociedade

Para muita gente, os governos devem atender a todas as necessidades básicas da população, como educação, saúde e segurança, construir e conservar estradas e ruas, mas cobrar pouco ou nenhum imposto. E há outros que vão mais longe ainda. Devem pagar altos salários, acrescidos de muitas vantagens funcionais.

Mas isso não existe no mundo real, cujos direitos devem ser obtidos na proporção em que cumprimos nossas obrigações, que, por justiça, devem nos outorgar os direitos correspondentes.

Assistimos no momento a um debate sobre o pacote de medidas enviado à Câmara pelo governo municipal, que inclui alterações no IPTU e exclusões e modificações de vantagens aos servidores.

O município ainda mantém vantagens que foram extintas ou estão em extinção na União e no Estado.
Também não sou a favor de aumento de impostos, mas, por outro lado, quero viver numa cidade sem buracos, onde a saúde pública possa ser estendida para a maioria e onde nossas crianças tenham ensino adequado. E isso não vem de graça, vem dos impostos, que devem ser arrecadados em maior proporção daqueles que podem mais. Não vejo outra solução para isso. Poderia dizer o contrário para ficar simpático, mas isso viria contra minhas convicções.

Mas há o outro lado do problema: a aplicação dos recursos arrecadados. E dessa situação só nos damos conta quando os impostos são aumentados.

 

"Impostos e sociedade" é o título do artigo de autoria do conselheiro do Corecon-RS, economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, publicado na página 25 da edição de Zero Hora desta quarta-feira, dia 9

O impasse da despesa com pessoal

A Lei 101/2000, conhecida como lei de responsabilidade fiscal (LRF), limitou a despesa com pessoal a 60% da receita corrente líquida (RCL) e definiu no seu artigo 18 os vários itens que a compõem. 

Como até hoje não foi criado o órgão encarregado de dirimir as possíveis dúvidas, esse papel vem sendo exercido pelos tribunais de contas estaduais.

Em nosso Estado, o Tribunal de Contas excluiu do rol da despesa com pessoal uma série de itens, entre eles as pensões, que correspondem a um quarto do valor das aposentadorias. O total excluído atinge 15% da RCL. Como não desaparece a obrigação do pagamento dessa despesa, isso elevou o limite citado para 75%, na prática. Com isso, ficaram sem cobertura orçamentária os investimentos e as prestações da dívida. Daí os enormes e recorrentes déficits.

Entre 2000 e 2015, em valores atuais, a despesa desconsiderada, excedente ao limite, alcançou R$ 49 bilhões. Nesse período, os investimentos foram de R$ 22 bilhões e os déficits, R$ 18 bilhões. Isso quer dizer que, se a LRF tivesse sido cumprida, os déficits não existiriam e, ainda, seria possível fazer mais do que o dobro dos investimentos feitos.

Além disso, foi gerado um impasse para a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal, junto ao Tesouro Nacional, porque o valor despendido com pessoal pelos critérios do TCE, diante das exclusões feitas, está abaixo do limite exigido pelo citado Regime.

Ocorre que, se esses limites da LRF não forem obedecidos, o Estado nunca se equilibrará, porque a despesa será sempre maior do que a receita.

Além disso, em 2016 foi editada a lei de responsabilidade fiscal estadual (LRFE), que estabelece regras para que a despesa com pessoal, tal como definida na lei federal, convirja ao limite de 60%, citado.

Diante disso, a pergunta que o governo deveria ter feito ao Tribunal de Contas é se ele vai manter os critérios adotados até agora, que estão em desacordo com a lei estadual referida (LRFE), ou se vai aceitar seus termos e exigir seu cumprimento, caso em que tornaria o Estado enquadrado nas exigências do Tesouro Nacional.

 

Artigo de autoria do conselheiro do Corecon-RS, economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, publicado na página 25 da edição de 28/03/2018, do jornal Zero Hora.

A abertura do Porto


Este momento histórico está associado diretamente a uma inflexão na economia da cidade que está em curso. Assim como abertura dos portos, a construção de uma cidade em desenvolvimento econômico é fundamental para mudar o curso da história. É preciso inverter a dinâmica local que nos colocou em um círculo vicioso de empobrecimento, derrubando sequencialmente empreendimentos, finanças e serviços públicos, qualidade urbana e nossa autoestima.

Precisamos criar um ambiente amigável aos atores econômicos para mobilizar a cidade para um ciclo virtuoso de crescimento. Temos implementado um conjunto de ações e projetos que constituem o Programa de Desenvolvimento Econômico de Porto Alegre, o Open POA. Elas estão mobilizando R$ 7 bilhões na economia local por meio de investimentos privados. São hospitais, shoppings, residenciais, prédios corporate, universidades, o aeroporto, centro de eventos, o cais, tantos outros. Somente o Cais Mauá, segundo estudos da PUCRS (Moraes & Fochezatto, 2015) injetará R$ 927,2 milhões ao ano e pode gerar 28,1 mil empregos diretos e indiretos quando estiver a pleno.

O desenvolvimento econômico é silencioso, requer planejamento, precisa de mudanças estruturais e o engajamento do cidadão. A marca da cidade se fortalece internacionalmente com a economia da orla, abrindo novos horizontes para Porto Alegre repensar e reposicionar seu futuro econômico.

Artigo do economista Leandro de Lemos, ex-presidente do Corecon-RS, secretário municipal em exercício de Desenvolvimento Econômico de Porto Alegre, publicado na página 20 de Zero Hora, do dia 02/03/2018. 

O mito do superávit da previdência



Recentemente ocorreu uma CPI que apontou a inexistência de déficit na Previdência, não sei baseada em que critérios, porque não me dei o trabalho de ler o relatório, que, em artigo da época, considerei-o inconsequente.

Sei que focaram nos devedores da Previdência. A necessidade inegável de cobrança desses débitos não autoriza a afirmar que ela ocorrerá na dimensão desejada, porque os principais devedores são empresas que já não existem mais. Além disso, em todos os Estados e municípios ocorre uma reduzida realização da dívida ativa e na União não seria diferente.

. O ingresso anual de recursos é mínimo. E, mesmo que fosse cobrado um valor significativo, resolveria o problema no momento, mas as causas do déficit continuariam a existir. Não se pode confundir estoque com fluxo.

A Previdência Social apresentou em 2017 um déficit de R$ 268,8 bilhões, com um aumento nominal de 18,5% sobre o exercício anterior. Desse total, R$ 182,5 bilhões devem-se ao Regime Geral (INSS), sendo R$ 71,7 bilhões da dependência urbana e R$ 110,7 bilhões, da rural. Pasmem! Um crescimento nominal de 21,8%, para uma inflação em torno de 3%.

O Regime Próprio dos Servidores Federais (RPPS) formou um déficit de R$ 86,3 bilhões, sendo R$ 48,7 bilhões dos servidores civis e R$ 37,7 bilhões dos militares. O crescimento nominal foi de 11,9% sobre 2016..

Isso na União, porque em muitos Estados, então, a situação é insustentável.

Nesses déficits ocorre uma grande injustiça, porque o RPPS é formado por pouco mais de um milhão de beneficiários e o Regime Geral, por mais de 30 milhões. No entanto, em termos financeiros, o que constitui a maior bomba é o INSS, cujo ritmo de crescimento da despesa supera o do PIB, enquanto o RPPS mantém a mesma relação com ele, sendo até declinante.

Uma das alegações dos que negam a ocorrência de déficit na Previdência é a existência das contribuições destinadas à Seguridade Social (art. 195 da CF), só que elas se destinam não só à Previdência, mas também à Assistência Social e à Saúde. O aumento dos gastos com a Previdência está reduzindo os recursos das outras duas áreas, podendo inviabilizá-las num futuro não muito distante.

O déficit da Seguridade Social em 2016 foi de R$ 258,7 bilhões, reduzindo-se para R$ 167 bilhões quando a ele se somam as DRU (desvinculações da receita da União). Isso, no entanto, não modifica em nada o resultado global, porque esse mesmo valor precisa ser deduzido da receita do Tesouro Nacional. O problema previdenciário não pode ser tratado como um problema contábil.

Como vimos, as DRU são inócuas, porque todo seu valor volta para a Seguridade e, ainda, tem que ser acrescido de R$ 167 bilhões do Tesouro Nacional, para complementar suas despesas. Não sei porque elas existem!

Tomemos os valores pelos seus globais para facilitar o entendimento. A parte da carga tributária de 2016 arrecadada pela União foi R$ 1.384 bilhões, ou 68,3% do total nacional. Descontando-se desse valor as parcelas dos entes subnacionais e as contribuições para o Sistema “S”, FGTS e Salário-Educação, entre outras, que não pertencem ao Governo Federal, restaram como receita líquida da União R$ 980 bilhões.

Dessa receita líquida, R$ 698 bilhões, ou 71,2%, pertencem à Seguridade Social, mas que não foram suficientes para suportar suas despesas, que somaram R$ 872 bilhões, ou 89% da citada receita líquida. No final, restaram apenas R$ 108,7 bilhões ou 11% da mesma base, para o atendimento de todos os demais encargos do Governo Federal, inclusive para fazer investimentos e superávit primário. Ver gráfico, no final.

Por isso é que ocorreu um déficit primário de R$ 159,5 bilhões em 2016, que, somado aos juros, ajudou a formar o expressivo déficit fiscal de R$ 477,8 bilhões (7,6% do PIB), segundo a STN. .Sem superávit, a dívida só cresce e, com ela, os juros, que podem deixar insustentável a situação das contas públicas, na ausência de uma reforma da previdência.

Para ler o texto completo, inclusive com tabelas e gráficos, clique aqui.


Artigo de autoria do economista Darcy Cavalho Francisco dos Santos, conselheiro do Corecon-RS e especialista em finanças públicas, publicado no Blog do Darcy Francisco, em 16/02/2018.

Impacto da Desoneração da Folha de Pagamento sobre o Emprego: novas evidências

Felipe Garcia, Adolfo Sachsida e Alexandre Xavier Ywata de Carvalho, Brasília, janeiro de 2018

Realiza-se uma avaliação quantitativa de impacto da política setorial de desoneração da folha de pagamentos, implementada a partir de 2012, sobre o volume de emprego de empresas aptas a participarem da mudança e atuantes em setores da economia beneficiados pela alteração. A desoneração é caracterizada pela substituição dos 20% de contribuição patronal ao regime de previdência incidentes sobre a folha de pagamentos por uma contribuição entre 1% e 2%, incidente sobre o faturamento das empresas. Com dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) para o período 2009-2015, compara-se, entre setores contemplados e não contemplados pela desoneração, a evolução da diferença no volume de emprego entre empresas afetadas pela desoneração e empresas não afetadas. Trata-se da estratégia de estimação de triplas diferenças. No geral, os resultados obtidos apontam para a ausência de efeitos da política sobre o volume de empregos.

Clique para acessar o trabalho: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=32196&catid=411&Itemid=433

Publicação Folha de São Paulo Online - acesse

Publicação Exame Online - acesse

Uma Nova Crise Global se Avizinha?

Como resposta à crise econômica mundial de 2008-2009, o mundo, capitaneado pelos Estados Unidos, promoveu uma série de medidas anticíclicas visando combater os efeitos nocivos daquele período de anormalidade. As principais ações englobaram políticas regulatórias, queda de juros e expansão monetária. Como ilustração, o governo do então presidente Barack Obama (2009-2017), em conjunto com o Banco Central norte-americano (Fed, na sigla em inglês), naquele momento presidido por Bem Bernanke (2006-2014), cortou os juros anuais ao menor nível da historia, entre 0% e 0,25%, além de promover a já citada política de expansão monetária que, entre outros mecanismos, empregou a recompra de títulos públicos daquela nação que se encontravam nas mãos de particulares. Para isso, elevou a base monetária norte-americana. Se por um lado não houve risco de disparada da inflação, dada a difícil situação em que o país se encontrava, por outro a dívida pública quase duplicou na gestão Obama, acelerando de menos de US$ 10 trilhões em 2008 para quase U$S 20 trilhões em 2017.

O cenário atual indica que o mundo, apesar de ainda não apresentar os números macroeconômicos do período pré-crise, caminha nessa direção. Mesmo que os Estados Unidos e a Europa já não pratiquem uma política monetária tão expansionista, mantêm suas taxas básicas de juros em níveis muito baixos (entre 1,25% e 1,5%, e 0,00%, respectivamente) dado a taxa de desemprego, sobretudo no velho continente, inspirar cuidados. Assim, é justo concluir que no momento que essas nações atingirem o chamado pleno emprego, as políticas fiscal e monetária se tornarão mais restritivas. No primeiro sinal de elevação da inflação, os juros deverão subir. Sem esquecer que a diferença entre o remédio e o veneno é a dose, a pergunta que fica é: quando esse momento chegará?
Em resposta a pergunta acima, as opiniões se dividem. Para alguns economistas e investidores o mercado já dá sinais que uma nova crise global se avizinha. Outros refutam tais afirmações, alegando serem necessários dados mais concisos para provar serem verdadeiras as citadas afirmações. Como instrumentos de trabalho, este estudo analisará três variáveis: o crescimento chinês, o preço do barril de petróleo e o nível das ações negociadas em Wall Street.
A China, que ao lado dos países emergentes – sobretudo dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) –, impediu que a crise se tornasse ainda mais crônica há 10 anos, não consegue mais atingir crescimentos anuais superiores a 10%. Nos últimos três anos, seu PIB anual não chegou a 7%. Enquanto algumas opiniões como a do megainvestidor George Soros indicam que o atual cenário pode acarretar significativas reduções nos preços das commodities, outras entendem que o gigante asiático está apenas se adaptando a um novo modelo de crescimento econômico em um quadro de normalidade.
Outro ponto de discórdia é o preço do barril de petróleo. Já tendo atingido mais de US$ 100 nos Estados Unidos, no final de 2015 chegou a ser cotado por cerca de US$ 30. Para os céticos, isso provém da desaceleração chinesa aliada a uma política nada promissora de queda de braço entre a única potência mundial e a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) em relação à adoção norte-americana do gás de Xisto, acarretando uma crise de superprodução. Conduto, para aqueles que não acreditam que uma nova crise está no horizonte, serve a alegação que os produtores de Xisto estão endividados, não mais conseguindo dar sustentação ao mercado. Logo, a maior nação da América do Norte aumentou sua demanda internacional por petróleo, fazendo com que o preço do barril se recuperasse e atingisse US$ 70 dólares na primeira quinzena de 2018.
Por último, o preço das ações negociadas nas bolsas norte-americanas. Para os que acreditam que a eclosão de uma crise é iminente, existe a alegação que o nível atual dos papeis está abaixo somente daqueles verificados em 1929 e 2000, períodos em que ocorreram ou precederam duas das piores crises globais que se tem notícia, sendo tal nível insustentável. Opiniões contrárias, contudo, entendem que o mencionado avanço é natural e que ainda existe espaço para um crescimento ainda maior. Para eles, isso pode ser confirmado pela previsão do crescimento global para os anos de 2017 e 2018, de 3,7% e 3,1%, respectivamente – mesmo com a ocorrência de uma pequena queda nada alarmante. Nesse sentido, se uma crise vier, não deve ocorrer em 2018 ou 2019.
Independente de se e quando a crise ocorrer e valendo-se da premissa ortodoxa que as crises capitalistas são cíclicas, algumas perguntas ficam no ar: qual será o papel dos Estados Unidos, uma espécie de esteio da economia global, na condução da recuperação mundial, dado as diferenças das gestões Roosevelt (1933-1945), Obama e Trump? Valerá a máxima do atual mandatário da Casa Branca de “América para os americanos”? Como se comportará à Europa, que a exceção da Alemanha, está repleta de lideres populistas como Thereza May e Emmanuel Macron? Os mecanismos de regulação dos mercados instaurados a partir da crise de 2008/2009 serão eficazes? Tais perguntas, ainda sem respostas, ficam no ar, aguardando que sejam contempladas da melhor forma possível para o bem de toda a humanidade.

por Stefano Silveira, economista e Professor Universitário

Prefeitura nos passos do Estado!

É tão grave a situação financeira do município de Porto Alegre, que se pode dizer que ele está indo para o mesmo caminho do Estado, embora sua dívida seja muito menor. Nos demonstrativos financeiros de janeiro a outubro do corrente ano, verifica-se que a receita cresceu nominalmente apenas R$ 215 milhões, ou seja, 5%, sobre igual período do ano anterior. No mesmo período, a despesa com pessoal cresceu R$ 334 milhões ou 16%, isto é, três vezes mais do que a receita. E, dentro da despesa com pessoal está o dispêndio líquido com previdência (déficit previdenciário mais contribuição patronal), que foi da ordem de R$ 208 milhões ou mais 27,7%, na mesma base de comparação. Então 97% do crescimento da receita foi absorvido pelo incremento da despesa previdenciária.

Isso só foi possível, porque entre despesas correntes e investimentos foram reduzidos R$ 216 milhões, naqueles gastos que seriam destinados às melhorias urbanas de que tanto se ouve reclamação. Sem fazer apologia ao aumento de impostos, porque a sociedade está cansada de pagá-los sem receber adequadamente os serviços a que tem direito, quero mostrar a incoerência dos vereadores de Porto Alegre. Os parlamentares, sempre tão ciosos em impedir aumento de impostos, deveriam dar o mesmo tratamento quando votam o aumento de despesa, especialmente, a com pessoal, que tem natureza permanente. A causa desse desequilíbrio está na criação de despesas com taxas de crescimento superiores às da receita, sem uma visão estratégica do que poderia ocorrer no futuro.

Conforme noticiado, as iniciativas de aumentar a receita são rechaçadas pelos vereadores, até mesmo pelos da base aliada. Mas não foi a gestão atual que criou despesas exageradas, nem mesmo as anteriores, isoladamente. Tudo foi feito no passado com o beneplácito do Poder Legislativo. Diante disso, pergunto aos senhores vereadores como vai ser governado o município. Confesso que não sei como.

 
Darcy Francisco Carvalho dos Santos, economista
ARTIGO - Notícia da edição impressa de 15/12/2017 - Jornal do Comércio

A conta chegou...

A lei de responsabilidade fiscal (LRF) fixou a despesa com pessoal estadual em 60% da receita corrente líquida (RCL), relacionando em seu artigo 18 os vários itens que a compõem. A RCL é parte da receita corrente que fica com o Estado.

Ao fixar a despesa com pessoal em 60%, deixou uma margem de 40% para cobrir as demais despesas do governo, inclusive pagar a dívida, e fazer investimentos. Em suma, buscou o necessário equilíbrio orçamentário.

O cumprimento adequado da LRF depende do conselho de gestão fiscal, cujo projeto de lei de criação foi encaminhado ao Congresso Nacional em 2000 e está até hoje pendente aprovação. Com isso, ficou um vazio, que foi ocupado pelos tribunais de contas estaduais.

No RS, em 2001, nosso Tribunal de Contas retirou uma série de itens que, pela LRF, seriam despesa com pessoal, como: assistência médica, auxílio funeral, creche, refeições, pensão por morte etc. Em seu entendimento, esses itens não são despesa com pessoal, porque o art. 169 da Constituição Federal só se refere a pessoal ativo e inativo, como se as despesas citadas fossem soltas e não se destinassem aos servidores estaduais. São despesas indiretas, mas com pessoal, sim!

Ao excluir despesas correspondentes a 15% da RCL, mas que continuarão sendo pagas, retirou a eficácia da lei . Assim, quando a despesa atingir os 60%, estará, de fato, em 75%, impossibilitando o equilíbrio orçamentário, porque os 25% restantes não pagam nem o custeio integralmente, muitos menos a dívida e os investimentos.

Mas isso possibilitou aos demais Poderes e órgãos especiais ficarem dentro dos limites da lei. E o Poder Executivo deixou de ter as sansões que advém de seu não cumprimento. Enfim, estabeleceu-se uma cumplicidade conveniente.

No entanto, ninguém ia imaginar que mais tarde, para aderir a um regime de recuperação fiscal, fosse necessário comprovar um percentual maior em pessoal. Na realidade o Estado aplica bem mais, só que pelos demonstrativos citados (maquilados) isso não aparece.

Como diz o ditado popular: a “mentira tem perna curta” e a verdade se fez presente, cobrando sua conta.

 

Artigo do conselheiro do Corecon-RS, economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, publicado na página 21, de Zero Hora do dia 28/11/2017.

Sem reformas, o Brasil vai quebrar

A frase de George Burns, um comediante americano, se aplica muito bem ao caso brasileiro: "É uma pena que todas as pessoas que sabem como governar o país estejam dirigindo táxi ou cortando cabelo".

No rol dos que pensam que sabem, mas pouco sabem como governar, eu incluiria mais algumas pessoas, inclusive alguns ilustres parlamentares. Passo a expor alguns dados, que me levam a firmar essa convicção.
"Sobrariam" 28% para as demais finalidades do governo central, mas isso não ocorreu

Em 2016, da arrecadação de tributos e contribuições no país, pouco mais de R$ 2 trilhões, 68% foi efetuada pela União e 32% por Estados e municípios.
Do total arrecadado, a União repassou uma parte aos entes federados e canalizou outra para as finalidades dos tributos e contribuições com destinação específica (salário-educação, FGTS e Sistema "S"), restando-lhe líquidos 48%.
Desse líquido, 72% é destinado à seguridade social (previdência, saúde e assistência social). Com isso, "sobrariam" 28% para as demais finalidades do governo central, mas isso não ocorreu porque uma fatia desses recursos precisou financiar parte das despesas da seguridade que não cabem dentro dos 72% citados.
Então, o total líquido que ficou com a União atinge a ainda elevada soma de R$ 985 bilhões. No entanto, R$ 872 bilhões foram aplicados na seguridade social (88,5%), restando para todas as demais finalidades R$ 113 bilhões, ou 11,5%.
Com esses 11,5%, a União precisou financiar todos os poderes, os demais 25 ministérios e órgãos especiais, inclusive o Ministério da Educação, ao qual são destinados 18% da receita líquida de impostos, porque lhe cabe manter mais de 60 universidades e órgãos afins. Também com eles, o Ministério dos Transportes precisa construir ou manter estradas, portos, aeroportos que ainda não foram privatizados.
Por tudo isso, o déficit primário do exercício foi de R$ 160 bilhões, que, somados ao montante de juros de R$ 318 bilhões, atingiu R$ 478 bilhões de déficit fiscal (7,6% do PIB, um dos maiores do mundo).
A dívida bruta total atingiu R$ 4,6 trilhões. A ela foram acrescidos integralmente os juros, mais o valor do déficit primário.
Com tudo isso, ainda há quem afirme que o país não necessita de reformas. Pasmem!

DARCY FRANCISCO CARVALHO DOS SANTOS
Economista 
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Publicado na página 26 da Zero Hora, do dia 10/11/2017

Um relatório inconsequente!

Dizia Maquiavel que “a ambição do homem é tão grande que, para satisfazer uma vontade presente, não pensa no mal que daí a algum tempo pode resultar dela”.

Só posso concluir isso do relatório de uma CPI que diz não haver déficit na Previdência, quando são altamente deficitárias a previdência privada e a pública, na União e nos Estados. Não é por acaso que os três Estados, MG, RJ, RS que atravessam a maior crise financeira, são exatamente os que mais despendem recursos com previdência.

O déficit de qualquer entidade é dado pela diferença entre receitas e despesas, e na Previdência não é diferente. O déficit do INSS em 2016 foi de R$ 152,2 bilhões, sendo maior na previdência rural. E o mais grave é que ele cresceu 61% sobre o ano anterior. No serviço público federal, o déficit foi de R$ 78,6 bilhões. Somando INSS e servidores, atingiu R$ 231 bilhões.

O argumento é de que existem as contribuições sociais, destinadas à seguridade social (previdência, saúde e assistência social), que também gerou déficit de R$ 258,7 bilhões em 2016, e que as DRU (desvinculações das receitas da União) lhes retiram dinheiro. Mas, se somarmos as DRU ao déficit, ele ainda fica em R$ 167 bilhões.

As fontes referidas no relatório costumam dizer, também, que não há déficit porque houve isenções, desonerações de tributos e sonegação, como se a existência desses fatos representasse ingresso de recursos.

E os devedores da Previdência? Precisa haver cobrança rigorosa. Mas a solução não está num ingresso eventual de recursos, por maior que ele seja, mas em tornar positivo o fluxo de recursos correntes.

Na Previdência, há dois tipos de déficits: o financeiro e o atuarial, este tendo a ver com o futuro. Qualquer pessoa entende que, para uma alíquota de 31%, necessita de mais de três contribuintes por beneficiário para o equilíbrio. A revista Conjuntura Econômica, na edição de abril/2017, mostra que em 2015 a relação contribuintes/beneficiários era 2,19, relação essa que cai para 1,55 em 2030 e para 0,90 em 2060.

Diante disso, quem sustentará os aposentados no futuro? Negar que haja déficit na Previdência é, no mínimo, uma atitude irresponsável e inconsequente para com o futuro de nossas crianças.

DARCY FRANCISCO CARVALHO DOS SANTOS
Economista
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