Lições do coronavírus para a humanidade

Não há dúvida de que o coronavírus, de uma hora para a outra, transformou a vida das pessoas que habitam o planeta terra. Mesmo que o verdadeiro problema criado pela Covid seja o colapso da economia dos países, o que não foi o caso da China e índia que constataram seus PIBs crescerem na pandemia entre os 48 maiores países do mundo, provando as suas capacidades de desenvolvimento em benefício das duas maiores populações do planeta; China com 1,3 bilhões e Índia com 1,1 bilhão de habitantes. Por outro lado, do ponto de vista das relações internacionais e econômicas, há previsões de que o mundo nunca mais será o mesmo. Segundo uma previsão otimista, a necessidade óbvia da participação do Estado no enfrentamento da atual crise – caso inclusive de países neoliberais como o Brasil – aponte para um mundo em que o Estado voltará a ser protagonista e os governos mais propensos ao social.

Não há dúvida que a crise que se vive em 2021, com os conflitos, as mudanças climáticas e a Covid-19 será a maior desde a 2ª guerra mundial. Pensou-se que as guerras como efeito de problemas, políticos ou religiosos cessariam com a pandemia o que seria uma ótima razão para a volta da paz entre as nações. Mesmo que se torça para que os atos de guerra, neste momento, possam ser paralisados, pois o inimigo agora é o vírus e não os humanos que vivem em milhões nas zonas de conflito, não tem sido esta a realidade e os protagonistas sanguinários ignoram a existência da pandemia. Nos últimos nove anos vários países estão em guerra como a Síria, o Afeganistão, e vários outros, sendo devastado e ainda contaminado pela Covid-19, o que agrava a situação. Nesse contexto, a situação piorou no Iêmen, país do Oriente Médio que há quatro anos é devastado o que parece não preocupar os dirigentes com a pandemia e se joga na luta mesmo vivendo a triste realidade da destruição dos seus hospitais por bombas onde 80% da população clamam por ajuda humanitária para continuar sobrevivendo. Certamente a pandemia e a guerra destruirão o país por inteiro em pouco tempo. Na Síria não é diferente, os conflitos tem resultado em milhares de mortos, ignorando os que agonizam com a pandemia. Outros países envolvidos em conflitos parece estarem dispostos a interromper os combates, como no caso de Camarões, República Centro-africana, na Colômbia, na Líbia, em Mianmar, nas Filipinas, no Sudão do Sul, na Síria, na Ucrânia e no Iêmen. Existe, neste momento, uma boa oportunidade para a paz, mas os humanos insistem em desconhecer o verdadeiro inimigo.

A tempestade da Covid-19 ultrapassou as fronteiras dos países, independente de estar ou não em conflito, mostrando sua força superior aos canhões ou misseis utilizados nos conflitos, atingindo as populações já fragilizadas pelos horrores das guerras. Ainda há tempo para os sanguinários dirigentes dos conflitos mundiais entenderem que o atual inimigo da humanidade não é o seu semelhante, mas a COVID-19, e é contra ela que o mundo deve voltar as suas atenções, unir seus conhecimentos científicos, produzir antígenos, capaz de erradicá-la de vez.

Artigo, de autoria do economista João Carlos M. Madail, Conselheiro do Corecon-RS e Diretor da ACP - Pelotas, publicado no Diário Popular de Pelotas, edição do dia 09 de abril de 2021.

Reforma da previdência de Porto Alegre: uma necessidade

A Emenda Constitucional n° 103/2019, que alterou o sistema da previdência social brasileiro, deixou para estados e municípios a competência para legislarem sobre muitas de suas próprias regras. E isso vem causando grandes dificuldades, como o que está ocorrendo em Porto Alegre.

As mudanças na previdência deixam evidentes aquela metáfora muito usada em economia: “o que é bom para a árvore nem sempre o é para a floresta”.

Para as pessoas, individualmente, o bom seria pagar uma contribuição reduzida e aposentarem-se cedo, com remuneração integral, mantendo a paridade com os servidores da ativa. Esse sistema é o que existe ou existia até pouco tempo, mas vem gradativamente sendo alterado, por ser incompatível com os orçamentos públicos.

As receitas públicas encontram limite no crescimento do PIB, cujas taxas vêm apresentando incrementos reduzidos, pelo baixo crescimento populacional e a diminuta produtividade das economias.

Os sistemas de repartição ainda predominantes apresentam um problema estrutural que se acentua a cada ano, que é a redução no número de contribuintes para o de beneficiários. No Estado do RS, por exemplo, baixou de 4 por 1 da década de 1970, para menos de 0,7 por 1, atualmente. A expectativa de vida aos 60 anos passou de 15 anos na década de 1980 para 22 anos atualmente, e continua crescendo.

A criação do regime de capitalização a partir de uma data de corte, como fez a nossa Capital e, posteriormente, a aposentadoria complementar, são as alternativas corretas, mas apresentam um alto custo de transição. Por exemplo, em 2020 foram despendidos a títulos de benefícios e contribuição patronal para os dois sistemas mais de R$ 1,4 bilhão ou 22% da receita corrente líquida e, só não foi maior pelas medidas tomadas em nível federal de combate ao coronavírus, com o congelamento da folha até o final do corrente exercício e as transferências de recursos.

O poder público tem uma demanda crescente de serviços na educação, na saúde em outras áreas, e não há como cobrar mais impostos da população, por razões que dispensam comentários. Do governo federal nada dá para esperar, diante da sua grave situação deficitária, que deve perdurar por vários anos ou até décadas.

Como não podemos manter constantes as regras que regulam uma realidade que constantemente varia, precisamos fazer reformas.

 

Artigo de autoria do economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas e conselheiro do Corecon-RS, publicado no Jornal do Comércio de Porto Alegre, de 25/03/2021.  Leia aqui

Como sobreviver sem emprego e renda

A descoberta do corona vírus impôs ao mundo mudanças profundas de comportamento e hábitos. O enfrentamento da pandemia, a princípio, parecia ter dia e hora para ser dominado, mas aos poucos se observou que a situação era mais grave do que se imaginava e os prognósticos foram todos reformulados e lá se vão 12 meses e a situação ainda não foi controlada. Nesse período, vários Decretos governamentais impuseram e continuam impondo restrições aos negócios, exigindo que as pessoas não circulem, fiquem em casa por longos períodos. As pessoas em casa estão protegidas, mas os negócios estão sendo impactados negativamente, levando os pequenos e médios empresários a quebradeira geral. O resultado são 14,1 milhões de desempregados no país até o primeiro trimestre de 2021. Muitas pessoas não estavam preparadas para enfrentar o desemprego, o que se justifica a primeira vista. Contudo, mesmo para essas pessoas se recomenda um pouco de calma. É preciso buscar soluções conscientes em relação ao grave momento que se vive. O desemprego apresenta muitos desafios e pode ser visto como uma oportunidade de se reinventar e, quem sabe descobrir uma atividade nova que sempre sonhou realizar e que pode lhe trazer renda e conseguir sobreviver o momento. Está cada vez mais difícil para quem busca um emprego. Emprego com carteira assinada, neste momento é coisa rara. O que se pode encontrar, contando com a sorte são trabalhos. A demanda por trabalho nunca desapareceu, o que se precisa é abrir a mente para novas possibilidades. É preciso estar atento e observar o ambiente ao redor com olhar focado na identificação das necessidades das pessoas. Em geral as pessoas estão dispostas a pagar por trabalhos que resolvam os seus problemas e que, em condições normais, não conseguiam. Em tempos de crise ou não sempre existirão problemas para serem resolvidos, basta identificá-los. O momento não requer que se escolha o que fazer, mesmo que fora do status da profissão. As crises são hábeis e até essenciais para nos retirar das zonas de conforto. Para muitas pessoas atuar em algo que nunca sonhou e pela necessidade de executá-la pode lhe trazer sofrimento, mas o resultado dirá quem foi capaz de vencer a pandemia, mantendo a renda mínima que necessitou para a sobrevivência sua e da sua família. O momento é de mudanças e mesmo que saibamos que ela existe, nunca estamos preparados para enfrenta-la. Muitas pessoas, certamente, sairão da crise construindo um grande negócio que talvez jamais tivessem realizado sem este cenário de restrições que estamos vivendo. O que não dá é para ficar parado esperando a retomada da vida normal sem prognósticos confiáveis do fim da pandemia.

Artigo de autoria do conselheiro do Corecon-RS, economista João Carlos M. Madail, publicado no Diário Popular de Pelotas, dia 22/0/21.

A Lição de Pirro

Em 279 antes de Cristo, Pirro - rei e general do Epiro - travou contra os romanos a Batalha de Ásculo e conquistou a vitória. Porém, com um elevado número de baixas de oficiais e soldados, obteve prejuízos irreparáveis para o seu exército, o que comprometeu a continuidade da guerra contra Roma. Ao observar os saldos da batalha, Pirro teria dito: “outra vitória como esta e estamos acabados”. O episódio ficou conhecido como a“Vitória de Pirro”,termo que hoje é utilizado, para descrever uma vitória com efeitos prejudiciais ao vencedor.

O episódio vivido por Pirro, explica que determinadas estratégias ou decisões que desconsideram os aspectos complexos de relações existentes entre dois problemas, poderão levar a resultados desastrosos. É o caso de ter que escolher como prioridade a saúde ou a economia, diante da pandemia da Covid-19. Ao tomar como verdade uma falsa dicotomia entre saúde e economia, os resultados serão os mesmos contabilizados por Pirro. E as baixas já são evidentes. Na economia, já se observam a quebradeira de empresas, o aumento do desemprego, o aumento do endividamento e das despesas públicas, com redução na arrecadação, elementos que pulverizam as expectativas dos investidores e comprometem o futuro da vida da população.

As baixas na saúde e na vida humana são sentidas a cada minuto, com aumento do número de infectados, internações, filas para UTI, óbitos e possíveis sequelas da doença. A única forma de garantir a sobrevivência da economia e da vida humana passapela autorresponsabilidade de cada cidadão. Enquanto se aguarda ansiosamenteo acesso às vacinas, a população deve ser mais rigorosa com os cuidados, para reduzir a transmissão da doença. Da mesma forma, os setores econômicos devem colaborar no processo educativo da população, com o poder público realizando o máximo de esforços, para manter a atividade econômica, de uma forma que garanta e preserve a saúde das pessoas.Esta é a lição de Pirro: é mais importante vencer a Guerra, do que uma batalha.

Artigo de autoria do presidente do Corecon-RS, economista Mário de Lima, publicado na edição de sábado, dia 13 de março de 2021, do Jornal Zero Hora.

Desvalorização do real e suas consequências

 O preço da economia está alicerçado na taxa de câmbio e na taxa de juros. A taxa de câmbio representa o valor da moeda de um país em relação às demais moedas vigentes no mundo. O Real tem se desvalorização o que significa o enfraquecimento da economia brasileira, abrindo espaço para o crescimento da inflação, pois uma moeda fraca compromete todos os preços da economia que inclui desde medicamentos, até os alimentos e demais segmentos transacionados em dólar. Um exemplo desta afirmação está ocorrendo com a gasolina já que o petróleo é cotado em dólar. As empresas que operam com produtos importados têm os seus crescimentos comprometidos. O Brasil optou pelo sistema de câmbio flutuante, mas poderia ter optado pela taxa de câmbio fixa ou pela taxa de câmbio atrelada, sendo que cada uma das situações possui características diferentes e gera resultados distintos.

O sistema de câmbio flutuante adotado pelo Brasil é o mesmo adotado pela maioria dos países. Nesse sistema cambial o Banco Central define apenas a política monetária, ou seja, controla a taxa básica de juros e a base monetária. Assim a taxa de câmbio varia diariamente, dependendo da oferta de moeda estrangeira, da demanda de estrangeiros pela moeda nacional e, principalmente do humor dos investidores estrangeiros e dos especuladores em relação à situação econômica e política do país. Nesse cenário, a taxa de câmbio é um preço formado instantaneamente pela interação voluntária de bilhões de agentes econômicos que circulam no mundo. Esses agentes referidos, que acompanham o dia a dia das economias dos países, observam a perspectiva de inflação de preços, de um determinado país, a sua situação política e econômica, qual o futuro de sua moeda em relação a valorização ou desvalorização.

O que está ocorrendo no Brasil é uma fuga de capitais estrangeiros causados, pelo enfraquecimento da economia, aliado a polarização política que tem gerado desconfiança e insegurança para o mundo financeiro, refletindo diretamente na desvalorização do real e dificultando as importações, mesmo que estimule as exportações. Entende-se que a taxa de câmbio flutuante não funciona muito bem para os países ainda em desenvolvimento que necessitam de certa estabilidade monetária ou politica. Mesmo para os exportadores não há o estímulo esperado, visto que a inflação de preços resultante da disparada cambial afeta diretamente os custos do setor industrial ou agrícola que necessita importar insumos e maquinários indispensáveis as suas atividades. Na prática qualquer sinal de instabilidade, a taxa de câmbio não flutua, mas afunda, levando consigo a inflação de preços e a consequente queda no padrão de vida dos cidadãos.

Artigo de autoria do conselheiro do Corecon-RS, economista João Carlos Medeiros Madail, publicado na edição de 04/03/2021, do Diário Popular de Pelotas. 

Indicadores fiscais melhoram nos estados, mas RS segue na mesma

Os estados brasileiros e o Distrito Federal alcançaram um resultado primário global de R$ 65,1 bilhões no decorrer de 2020, equivalente a quase 1% do PIB brasileiro, apesar da forte recessão econômica ocasionada pela pandemia da Covid-19. O resultado orçamentário também foi positivo no montante de R$ 35,8 bilhões, tendo apenas dois estados apresentados números negativos (Minas Gerais e Rio Grande do Sul).

 

No ano passado, a situação financeira dos governos subnacionais foi bastante atenuada, pois, esses receberam R$ 78,2 bilhões de apoio financeiro da União e tiveram garantias honradas em empréstimos contratados — R$ 13,3 bilhões para os estados e R$ 66,0 milhões, os municípios —, sem contar as transferências adicionais realizadas ao Sistema de Saúde em virtude da pandemia e a suspensão do pagamento do serviço das dívidas refinanciadas com a União em 2020.

 

No caso gaúcho, detendo-se mais especificamente sobre as evidências estatísticas e examinando-se o seu desempenho fiscal em relação aos demais entes federados, percebe-se que, entre avanços e recuos, a sua situação fiscal não se alterou de modo qualitativo ao longo de 21 anos (2000-2020).

 

Mesmo com uma agenda voltada para o ajuste fiscal das contas públicas enfatizada por várias administrações estaduais, o RS apresenta péssimos indicadores fiscais em relação à RCL, se comparados aos demais estados da Federação. O presente artigo apresenta em detalhes esses números.

Veja o artigo completo aqui - https://bit.ly/3usK8cE

Artigo de autoria do economista Roberto Balau Calazans, Mestre em Economia pela UFRGS e Auditor Fiscal da Receita Estadual  aposentado.

Solução pioneira para a retomada do investimento público

Em 2020, a crise sanitária decorrente da Covid-19 agravou ainda mais a situação das finanças públicas municipais e estaduais, em decorrência do choque negativo na atividade econômica, combinado com a necessidade de aumento das despesas com saúde e assistência social. O impacto econômico, político e social só não foi pior nestes entes subnacionais, graças às diferentes soluções de transferências de recursos federais, construídas entre o Governo Federal e o Congresso Nacional, que minimizaram as perdas em decorrência da baixa atividade econômica. Como se não bastasse, o choque na economia pela ocorrência da pandemia também comprometeu a situação das finanças públicas da União, que precisou ajudar também diferentes setores econômicos, além de criar o importante auxílio emergencial. Estas ações impediram que os resultados sociais e econômicos de 2020, não fossem ainda piores. A economia brasileira, que já não vinha bem desde 2014, registrando sucessivos déficits primários, registrou até dezembro de 2020, um déficit primário do Governo Federal, no valor de R$ 743 bilhões, o equivalente a 10% do PIB brasileiro, o pior resultado da série histórica. Diante deste cenário, dificilmente a administração pública brasileira conseguirá realizar investimentos por meio de recursos públicos, especialmente após a pandemia. Dentre as necessidades de infraestrutura verificadas, o saneamento básico é um dos mais significativos. 

 

No Brasil, 35 milhões de pessoas, 16% de toda a população, não têm acesso à agua tratada, o que pode ter colaborado no agravamento da pandemia no País. Segundo o Atlas Esgotos (2017), o estado do Rio Grande do Sul não trata 52% do esgoto coletado no território estadual. Só não é pior do que os estados do Pará (55%), Rondônia (59%) e Maranhão (77%), estando bem acima da média brasileira, que é de 30%. Porém, com o Novo Marco Regulatório do Saneamento, o atual déficit de saneamento apresenta-se como uma grande oportunidade de retomada do investimento público, sendo uma solução pioneira para a recuperação econômica. Além de garantir regras claras e estabelecer critérios de regulação, para os serviços de saneamento concedidos à iniciativa privada ou por Parcerias Público-Privadas, o Novo Marco Regulatório garante a competição entre os candidatos à gestão do saneamento, submetendo uma concorrência que atrai o capital privado e garante a segurança jurídica. Mais do que isso, a exigência de aumento de produtividade e definição de metas de desempenho das prestadoras de serviços exigem investimentos para a universalização do saneamento no Brasil até 2033, podendo movimentar, em 12 anos, um valor estimado em R$ 960 bilhões. Num período em que a administração pública brasileira passa por uma crise fiscal profunda, incrementada pelos efeitos da Covid-19 na saúde da população e na economia, o Novo Marco Regulatório surge como uma alternativa relevante na retomada da economia, com investimentos públicos realizados por meio da iniciativa privada, gerando renda e empregos, e possibilitando a recuperação do setor público sem necessidade de aumentar a carga tributária.

 

Autoria do Presidente do Corecon-RS, economista Mário de Lima, publicado na edição do dia 22 de fevereiro do Jornal Pioneiro.

 

Regime de Recuperação Fiscal, discurso político e acumulação de dívida


Os dois últimos governadores defenderam a ideia de que o Regime de Recuperação Fiscal (RRF) seria o caminho viável para o ajuste das finanças estaduais, até porque é o único instrumento legal aceito pela União para governos subnacionais endividados. Durante o período eleitoral, o ex-governador Sartori muito insistiu que o Plano do RRF estaria pronto para ser assinado e que seria a melhor estratégia fiscal. Alguns economistas comparavam a adesão do RRF a uma boia em caso de afogamento.

O atual governador Eduardo Leite elegeu-se com um discurso calcado em um diagnóstico financeiro equivocado, mas que seduziu os gaúchos pelo voluntarismo. É bom relembrar que houve: (i) menosprezo às dificuldades da gestão do fluxo de caixa do Tesouro Estadual, (ii) falta de entendimento quanto à manutenção de alíquotas do ICMS (iii) e, indo para o terceiro ano de governo, falta ser dito se o Plano de adesão ao RRF projetará sustentabilidade fiscal continuada entre os anos de 2021-51. Registre-se que a sustentabilidade da dívida exige que o seu saldo atual seja igual ao valor presente dos resultados primários futuros, escolhida uma dada taxa de desconto. A sustentabilidade da dívida é assim calculada:

�� = % �!
∏ (1+�) ! !
"#$
!
!#%
onde:
�� = dívida atual;
�! = resultados primários futuros.

Contudo, deve-se reconhecer o mérito do atual governo e dos partidos aliados em realizar os ajustes necessários nas contas estaduais, e que a pandemia da Covid-19 atrasou as tentativas de negociação do RRF junto à União. Com a aprovação da LC 178, de 13/01/2021, muitos empecilhos passam a ser superados, colocando o RRF como prioridade em 2021. Para que este artigo não seja entendido apenas como uma crítica ao RRF, o tema será aprofundado com o devido rigor técnico que ele merece. Também estará presente no livro, Dívida Pública e Previdência Social, a ser lançado em breve. Desde 1998, o refinanciamento das dívidas estaduais é um tema amplamente debatido e, a partir de 2014, sucessivas leis complementares vem redefinindo as regras de refinanciamento acordadas com estados e municípios em 1998. Sem precisar descrever todas as alterações a partir de 2014, vamos comentar suas atualizações mais recentes.

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Artigo de autoria do economista Roberto Balau Calazans, Mestre em Economia  pela UFRGS e Auditor Fiscal da Receita Estadual  aposentado.

Conflitos e cooperação no desenvolvimento metropolitano


As governanças metropolitanas necessitam menos das atribuições constitucionais dos Estados da Federação e mais da liderança regional das metrópoles para atingir o desenvolvimento metropolitano.

O aparecimento e a formação das cidades¹ estão relacionadas com a existência de aglomeração de pessoas e firmas num determinado território, que irão definir o tamanho da produção econômica e, consequentemente, o tamanho dessas cidades². Com isso, o que irá descrever o desenvolvimento das regiões urbanas e o processo histórico de uma cidade ou região, será o resultado das barreiras de mercado³, colocando a metrópole⁴ como a principal cidade numa região metropolitana. Desta forma, as metrópoles exercem influência e atração econômica sobre as demais cidades metropolitanas, determinando os maiores fluxos de oferta e demanda de bens e serviços⁵.

As regiões metropolitanas são caracterizadas, inicialmente, pela contiguidade territorial, uma vez que diferentes municípios limítrofes formam um território de grandes dimensões, permitindo que elas sejam observáveis pela homogeneidade de comportamento e autossuficiência decorrentes da sobreposição da funcionalidade e influência das cidades⁶. Além disso, as regiões metropolitanas são também observáveis pela fusão das áreas urbanas dos diferentes municípios limítrofes, dando forma às grandes dimensões de um único e contínuo tecido urbano, que excede os limites políticos e administrativos dos municípios⁷.

A metrópole, faz com que as demais cidades metropolitanas sofram uma forte influência política e interdependência econômica por parte desta, caracterizando-se por uma elevada taxa de urbanização, alta densidade demográfica e movimentos pendulares da população⁸, o que denota a sua importância na região metropolitana⁹. Esta influência da metrópole demonstra a complexidade da urbanização neste tipo de região, refletindo não só sobre as suas dimensões territoriais, mas também atuando sobre a economia e os modos de vida da população¹⁰ , determinando uma grande interdependência e tornando-a observável pela produção, distribuição, acumulação da riqueza e reprodução social¹¹.

Com base nisso, seria possível às regiões metropolitanas atingir um desenvolvimento metropolitano satisfatório, sem a coordenação e a liderança regional da metrópole, para reduzir conflitos e gerar cooperação para soluções regionais de interesse comum? Dificilmente.

Historicamente, os municípios metropolitanos têm concentrado seus esforços na resolução de problemas locais¹² ao invés de se empenharem para solucionar problemas metropolitanos, desconsiderando as dificuldades comuns ao longo de todo o território regional, em que as soluções exigem esforço conjunto. Isso ocorre devido à dificuldade de adequação entre o território metropolitano e a conjuntura institucional da governança metropolitana, ao apresentarem dificuldades de cooperação entre os atores envolvidos¹³, dificultando o desenvolvimento metropolitano.

Dessa forma, quem deve promover e orientar o desenvolvimento das regiões metropolitanas são as metrópoles, devido às suas influências políticas e econômicas. Com sua liderança e influência, as metrópoles, podem estabelecer a construção de laços institucionais entre os diferentes municípios e os múltiplos stakeholders¹⁴ (prefeitos municipais, sociedade civil organizada, empresas, cidadãos, etc.), com o objetivo de dar condições ao desenvolvimento metropolitano, mesmo que as regiões metropolitanas no Brasil sejam de responsabilidade constitucional dos Estados da Federação¹⁵, para integrar, organizar, planejar e executar funções públicas de interesse comum.

Em 2021, todos os 5.571 municípios brasileiros deverão elaborar os seus Planos Plurianuais (PPA) para o período 2022–2025, que irão orientar as Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e as Leis Orçamentárias Anuais (LOA) para os próximos quatro anos. Neste sentido, a construção de soluções orçamentárias (PPA, LDO e LOA) dos municípios metropolitanos, mesmo que voltadas para soluções locais, devem ser orientadas para contribuir nas soluções dos problemas regionais, viabilizando o financiamento de soluções para diferentes problemas comuns¹⁶.

Para tanto, é necessário que as metrópoles realizem ações para o robustecimento das estruturas de governança existentes (ou, no caso da inexistência, a criação de estruturas de governança), consolidando-as como espaços de homogeneização das informações para a tomada de decisão e que permitam gerar impactos territoriais da escala metropolitana para a escala local, pois são nestes espaços que ocorrem os conflitos e a cooperação no desenvolvimento metropolitano. As estruturas de governança são espaços institucionais formados por um conjunto de coalizões de stakeholders presentes nas regiões, que se engajam em ações de advocacy¹⁷, na defesa e reivindicação de diferentes interesses, junto às instâncias político-administrativas e instituições. São nestes espaços, que os stakeholders, expõem os seus diferentes interesses¹⁸.

Obviamente, quando os interesses conflituosos dos stakeholders se tornam públicos, o ambiente de governança se torna uma matriz de conflitos. Porém, quando esses conflitos ficam explícitos, tornam-se visíveis os entraves que bloqueiam o processo de desenvolvimento metropolitano¹⁹.

Os stakeholders, ao tornarem esses conflitos visíveis, expondo suas posições e pontos de vista, dão início à articulação e construção de alianças políticas perceptíveis. Neste sentido, por meio das estruturas de governança metropolitanas existentes, é possível estabelecer uma coordenação que busque a cooperação a partir dos conflitos, possibilitando a construção e a montagem de acordos, concessões e renúncias entre os stakeholders, estabelecendo assim, projetos conjuntos entre as partes²⁰.

Dificilmente as metrópoles ou os demais municípios metropolitanos irão atingir o desenvolvimento local desejado, se as soluções não forem concebidas observando os problemas regionais metropolitanos, por meio da coordenação cooperada, a partir de conflitos explícitos. Diante da diversidade de estruturas de governança definidas nos diferentes sistemas de políticas públicas do Brasil²¹, o instrumento legal-normativo que possibilita a construção de uma coordenação metropolitana eficiente é o Estatuto da Metrópole²².

A Lei Federal 13.089, de 12 de janeiro de 2015, denominada Estatuto da Metrópole, determina o estabelecimento de uma regionalização administrativa estabelecida pela integração das estruturas de governança metropolitanas, possibilitando a interação do planejamento e da execução das políticas, congregando de forma real, todos os stakeholders envolvidos no desenvolvimento metropolitano.

O Estatuto da Metrópole estabelece diretrizes para o planejamento, gestão e funções públicas de interesses comuns nas microrregiões, aglomerações urbanas e regiões metropolitanas, prevendo um Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI). Para tanto, ele define um regramento para os PDUIs entre os municípios, estados e a União, garantindo ainda a participação dos stakeholders, para solução de problemas de interesse comum, tendo condições de estabelecer soluções metropolitanas e locais para os municípios destas regiões.

É necessário que os governos municipais metropolitanos, liderados pelas metrópoles, orientem suas políticas às idiossincrasias das regiões onde estão inseridos, e utilizem as oportunidades dadas pelo Estatuto da Metrópole como instrumento de coordenação e cooperação de políticas públicas, a partir dos conflitos metropolitanos. É imprescindível a coordenação dos interesses dos stakeholders para solucionar os problemas de desenvolvimento encontrados nas regiões metropolitanas.

Os problemas locais das cidades metropolitanas só conseguirão ser solucionados se também forem considerados e coordenados como problemas regionais e, para isto, é fundamental ter como liderança desse processo a cidade polo, a metrópole. Sem esse entendimento, dificilmente os problemas locais e regionais serão resolvidos.

A solução do desenvolvimento metropolitano passa pelos interesses locais, orientados à cooperação regional, construída dentro das estruturas de governança, liderada e coordenada pela metrópole, por ser a cidade mais importante, em decorrência da sua influência política e econômico-regional, sobre as demais cidades. Portanto, é evidente a impossibilidade de consolidação do desenvolvimento metropolitano sem a liderança do centro de atração econômica do território, que também deverá exercer um papel político-institucional na condução da resolução dos problemas.

Notas e Referências
[1] TINOCO. A. C. Das economias de aglomeração às externalidades dinâmicas de conhecimento: por uma releitura de São Paulo. In: Anais do X Encontro da ANPUR, Belo Horizonte, 2003.
[2] Neste sentido, a teoria das economias de aglomeração, explica que a formação das cidades está relacionada com a existência de aglomeração de pessoas e firmas no espaço (território). Num determinado território, o aumento no número de firmas e trabalhadores criam retornos crescentes de escala, possibilitando um aumento proporcionalmente maior na produção econômica desse território (LIMA, 2018) — ver nota 11.
[3] HENDERSON, J. V. The sizes and types of cities. American Economic Review, v. 64, p. 640–656, 1974.
[4] Chamada também de cidade núcleo.
[5] BERNARDI, J. L. Funções sociais da cidade: conceitos e instrumentos. 2006. 136 f. Dissertação (Mestrado em Gestão Urbana) — Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia, Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Curitiba, 2006.
[6] BAUCHET, P. Les Tableaux Économique. Analyse de la Région Lorraine. Paris: Génin, 1955.
[7] FREITAS, R. Regiões Metropolitanas: uma abordagem conceitual. Humanae, v.1, n.3, p. 44–53, dez. 2009.
[8] Ver nota 6.
[9] COSTA, M. A.; TSUKUMO, I. T. L. 40 anos de Regiões Metropolitanas no Brasil. Brasília: IPEA, 2013. p. 187–203.
[10] MOURA, R.; FIRKOVSKI, O. L. C. de. Metrópoles e regiões metropolitanas: o que isso tem em comum? IX Encontro Nacional da ANPUR. Anais. Rio de Janeiro: ANPUR, 2001, v.1, p.105- 114.
[11] LIMA, Mário Jaime Gomes de. (2018), Proximidade e governança metropolitana: cooperação e conflitos nas políticas públicas ambientais da região metropolitana de porto alegre (RMPA). 2018. 250 f. Tese (Doutorado em Economia do Desenvolvimento) — Escola de Negócios, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre/RS, Brasil.
[12] Neste caso é um sinônimo para municipais.
[13] DAVANZO, A. M. Q.; NEGREIROS, R.; SANTOS, S. M. M. dos. O fato metropolitano e os desafios para sua governança. Revista Paranaense de Desenvolvimento-RPD, n. 119, p. 65–83, 2010.
[14] Estruturas, grupos ou pessoas que participam e possuem interesse em determinado empreendimento ou território. Eles podem ser membros ou órgãos da sociedade civil, governo e outras instituições.
[15] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Constituição Federal de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: 20 dez. 2020.
[16] Ver nota 11.
[17] O termo advocacy designa as atividades realizadas com o objetivo de influenciar a formulação de políticas públicas.
[18] Ver nota 11.
[19] TORRE, A. Jalons pour une analyse dynamique des Proximités, Revue d’Economie Régionale et Urbaine, n. 3, p. 409–437, 2010.
[20] Ver nota 20.
[21] Estruturas de governança existentes como os Comitês de Bacias Hidrográficas; Conselhos de Desenvolvimento; Conselhos Regionais de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul (COREDES); Consórcios Municipais, Associação de Municípios, etc.
[22] Brasil. Lei n. 13.089, de 12 de janeiro de 2015. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13089.htm>. Acesso em: 20 dez. 2020.

Artigo de autoria do economista Mário de Lima,  Doutor em Economia do Desenvolvimento, professor universitário e presidente do Corecon-RS, publicado no site Economistas no Debate.

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O Brasil está quebrado?


O Brasil não está quebrado, porque, apesar das mazelas sociais, tem grandes potencialidades e uma economia em que apenas um dos estados membros tem um PIB maior do que o do principal país da América do Sul. O que está quebrado é o setor público brasileiro, e não é de agora. A crise do coronavírus apenas aprofundou uma situação que veio se formando ao longo dos anos.

O ilustre economista Roberto Campos dizia que “o Brasil é uma economia em que as aspirações superam em muito a capacidade de gerar satisfações”. Nessa frase reside a origem dos problemas brasileiros. Senão, vejamos:

Em 1991, os gastos primários (sem os juros) do Governo Central eram 13,7% do PIB, alcançando em 2019 22,6%, num crescimento anual de 0,3 pontos percentuais, quando a variação real do PIB deveria ser o limite intransponível.

Nos últimos anos, os gastos com seguridade social (previdência, saúde e assistência social) absorveram 80% da receita líquida do governo, sem que se pagasse para a imensa maioria uma aposentadoria satisfatória e nem um atendimento adequado na saúde e na assistência social. Como se vê, restaram apenas 20% da receita líquida para atender mais 37 ministérios e secretarias e os demais Poderes e órgãos especiais. O resultado disso são os enormes déficits primários que se somam à dívida pública, que passou de 51% do PIB em 2013 para 76% em 2019, e já estava em 91% em novembro do ano passado. E só não cresceu mais porque a Selic está em 2%, a menor taxa da história, mas o que não se sustenta com o tempo.

É verdade que grande parte disso é reflexo da queda de mais de 7% do PIB em 2015 e 2016 e no baixo crescimento dos anos subsequentes.

Há uma crença generalizada de que os tributos estão concentrados no Governo Central, o que não passa de um mito, porque dos 67% que aparentemente ficam com a União, na realidade, ela dispõe de 15%. Em função disso, os demais entes pressionam o Governo Federal por mais recursos e acabam obtendo aprovação do Congresso. E a situação fiscal cada vez se agrava mais.

O ano de 2020 foi atípico, mas o déficit primário que vinha sendo reduzido, somente até novembro alcançou R$ 700 bilhões. No final do ano, somando aos juros, deverá superar um trilhão de reais. É verdade que há (ou havia) muita corrupção, mas com essa composição entre receita e despesa federais, nem um governo de anjos resolveria.

Artigo de autoria do conselheiro do Corecon-RS, economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, publicado na edição de 11/01/2021 e no site financasrs.com.br

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