As reflexões de Lara Resende e a elevação da taxa Selic

A política monetária no Brasil é caracterizada por manter o juro básico da economia — a taxa Selic — em patamar elevado durante décadas, contribuindo, assim, para a elevação da dívida bruta devido à incorporação crescente de juros nominais. Desde a implantação do Plano Real, ela oscilou, em termos nominais, de 53,1% ao ano em 1995 até uma taxa histórica de 2% ao ano em agosto de 2020, voltando a se elevar para 3,5% em maio de 2021 (Gráfico 1).

Entre 1994–1999, a estabilização dos preços se deu mediante a âncora cambial, exigindo os juros elevadíssimos para atrair capitais externos. A implantação do regime de metas de inflação, a partir de 1999, também exigiu credibilidade para controlar as expectativas de mercado, assim como sacramentou uso da taxa de juros para manter o controle inflacionário.

A partir de 1999, sucessivos governos de matizes diferenciados, pelo menos no discurso político, conduziram a mesma política monetária, mantendo a média da Selic nominal em 16% ao ano (1995–2020). Esse padrão de juros elevados passa a contrastar com os principais bancos centrais do mundo, principalmente num contexto de flexibilização monetária e de taxas básicas reduzidas após a crise internacional de 2008.

Chega ser paradoxal que a redução da taxa básica no Brasil tenha ocorrido mais fortemente durante a gestão do Ministro Guedes, adepto da escola de Chicago. No entanto, convém registrar duas questões relevantes. Primeiro, a queda da Selic se iniciou em 2016, atingindo o patamar mínimo em 2020. Segundo, a taxa implícita da dívida permanece elevada para os títulos públicos de longo prazo.

Como uma reação inevitável do mercado financeiro brasileiro, pressionado por rendimentos reais negativos na renda fixa, os tambores rufaram em nome de uma nova taxa de juros neutra, obviamente maior. A cada nova reunião do Copom, muita mídia é gasta para justificar a elevação da Selic (2,75% ao ano e, agora, 3,5%).

No modelo teórico, um excesso de produto acima do potencial pressionaria a inflação, obrigando o Banco Central (Bacen) a elevar a taxa de juros para conter o excesso de demanda, forçando a queda do nível de preços. Todavia, como bem alertou Lara Resende (2021a; 2021b) em artigos recentes: qual é o foco teórico do excesso de demanda ou da elevação das expectativas futuras, se há desemprego elevado e capacidade ociosa em setores da economia, bem como enormes reservas em dólares depositados no Bacen?

Se as expectativas do mercado estão infladas por um risco de “dominância fiscal”, qual é a coerência em elevar a taxa básica, a qual pressionará a despesa financeira do Tesouro Nacional? Tudo isso, soa muito contraditório com as evidências.

De forma crítica e consistente, esse economista vem publicando livros (cito Juros, Moeda e Ortodoxia) e artigos no Valor Econômico, questionando os fundamentos da moderna macroeconomia, seja ela neoclássica, seja novo clássico. Ele argumenta que o velho postulado da teoria quantitativa da moeda foi sepultado, pois vem ocorrendo a flexibilização quantitativa na política monetária executada pelos principais bancos centrais do mundo e a inflação continua estável na Europa, Estados Unidos, Japão etc.

Também sugere que o excesso de dedução matemática inclusa nos atuais modelos teóricos são abstrações ideais, de cunho conservador, sendo que a hipótese de “expectativas racionais” reflete a radicalização da tese de que o “mundo das ideias” se sobrepõe a realidade. Como já disse Joan Robinson, os modelos teóricos de análise parcial ou geral trabalham com relações estacionárias de equilíbrio. Dadas as equações gerais, a postulação de equilíbrio (taxa de juros neutra, desemprego natural etc.) é um processo lógico que só existe aos olhos de quem constrói o modelo.

Em termos do debate teórico, uma das reflexões recentes de Lara Resende (2017, p.133-134) é revisitar as novas contribuições à macroeconomia, como a Teoria Fiscal do Nível de Preços. Esta última interpreta a conhecida restrição orçamentária do governo como uma condição de equilíbrio. A igualdade entre o déficit nominal e o valor presente dos resultados primários futuros não é apenas determinado pelo resultado primário, mas também pelo nível de preços que atua em ambos os lados da igualdade.

O papel da inflação seria reduzir o valor real do passivo nominal (dívida pública e moeda), havendo uma nova causalidade para a determinação do nível de preços. Os preços determinam a inflação e não ao contrário como supõe o monetarismo. A âncora do nível de preços e da inflação é de base fiscal, sendo o papel da política monetária interferir na taxa de juros básica e, assim, em toda sua estrutura a termo.

A migração dos bancos centrais para o regime de metas de inflação, em substituição ao controle dos agregados monetários, é uma prova empírica de que a plena postulação monetarista não encontra mais respaldo na execução da política monetária. Portanto, tais questionamentos negam os fundamentos da argumentação do monetarismo, que é ainda ensinado como uma verdade universal e serve de guia ideológico para o mercado financeiro.

Voltando ao caso concreto do Brasil, em recente Nota Técnica (2021), o Ministério da Fazenda calculou a economia fiscal obtida pela queda dos juros no Brasil entre novembro de 2016 e dezembro de 2020. A taxa de juros implícita da dívida líquida do governo central caiu de 43,4% ao ano em janeiro de 2016 para 8,9% ao ano em dezembro de 2020, representando uma economia de R$ 900 bilhões em apenas 50 meses.

Informações adicionais são encontradas nas estatísticas fiscais disponibilizadas pelo Banco Central. Nelas aparecem dimensionados o montante de juros nominais pagos e/ou incorporados à dívida bruta do governo geral (DBGG) e os fatores determinantes de sua expansão.

Fazendo-se um balanço dos últimos 15 anos (2006–2020), as estatísticas revelam que a dívida bruta saltou de R$ 1,3 trilhão em 2006 (55,5% do PIB) para R$ 6,6 trilhões ao final de 2020 (88,8% do PIB), expresso em vertiginoso incremento de R$ 5,3 trilhões.

Os fatores que condicionaram à sua expansão são: a incorporação de juros nominais (R$ 4,4 trilhões); as emissões líquidas de títulos mobiliários (R$ 555 bilhões); o reconhecimento de dívidas e/ou privatizações (R$ 52,7 bilhões); e a política cambial de compra de reservas internacionais (R$ 232,4 bilhões). Assim, a incorporação de juros nominais é responsável por 84% da expansão da dívida bruta (Tabela 1 do Anexo). Esses juros alcançam uma média de 5,8% do PIB, com uma estimativa de custo médio na ordem de 10,9% ao ano, expressa em uma Selic média nominal de 10% ao ano para o período em questão (Tabela 2 do Anexo).

Um dos pontos centrais dos mencionados artigos, reconhecido pelo citado autor, é que a elevação dos juros aumenta a despesa financeira do orçamento fiscal, logo serve como agravante ao desequilíbrio das contas públicas. Lembre-se que o setor público brasileiro registrou resultados primários positivos (2002–2013) e mesmo assim o déficit nominal continuou elevado.

Tudo isso parece óbvio e já amplamente debatido. Contudo, boa parte dos economistas e da sociedade insistem em identificar o problema do déficit público quase que exclusivamente relacionado aos gastos públicos. Quando se observa os montantes de juros nominais (em média R$ 320 bilhões/ano), é bom lembrar que ele é apropriado, em parte, pelos detentores de riqueza líquida. Como bem observa Lara Resende (2021b): “O aumento dos juros é uma transferência direta do Estado para os detentores da dívida, para aqueles a quem a fortuna, vamos dizer assim, deu renda superior às suas necessidades e lhes permitiu acumular riqueza em títulos públicos”.

Isso representa um fato marcante no relacionamento que se estabelece entre o Tesouro Nacional e o Bacen, já que a expansão do passivo nominal do governo é determinada pelo crescimento da despesa financeira e a taxa de juros é a sua responsável. Com juros elevados não há expansão consistente da demanda agregada e nem ambiente para os investimentos necessários ao crescimento econômico.

Registro, contudo, que os dois parágrafos anteriores não podem ensejar uma interpretação marxista, bem conveniente ao movimento sindical. Em recente discurso o Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, disse que Wall Street não construiu a América. Poderia ser acrescentado que, provavelmente, os bancos emprestaram os fundos necessários ao desenvolvimento, mas certamente não conduziram a destruição criativa.

Transpondo tal assertiva ao caso brasileiro, enquanto continuarmos presos à política monetária conservadora com os juros e a sua estrutura a termo, o fluxo de caixa da economia real continuará deprimido, criando-se uma barreira objetiva ao investimento privado. Essa é uma conclusão de inspiração keynesiana relembrada por Lara Resende.

De um lado, mantida a lógica de que “r>g”, sempre haverá uma reforma ou corte adicional a ser realizado sobre o gasto público, objetivando manter os fundamentos da restrição orçamentária do governo. Implícito nessa lógica está o “esquecimento” dos juros nominais, afinal a geração de resultados primários positivos garante o pagamento devido aos detentores de riqueza.

De outro, no campo da oposição ao sistema de mercado ou do populismo fiscal, sempre haverá a interpretação equivocada de Keynes: a elevação dos gastos públicos como a solução milagrosa à substituição da iniciativa privada e ao fortalecimento do capitalismo de Estado, ou seja, somente se vislumbra o “crowding in”.

O peso do passivo nominal dos governos e as despesas com juros continuam a impactar os orçamentos fiscais, ainda que tenha decaído o serviço da dívida nos anos recentes devido à queda da Selic. Além disso, há outros fatores que dificultam o equilíbrio orçamentário. A expansão dos déficits previdenciários foi, em parte, decorrente de um fenômeno demográfico e por problemas intrínsecos ao regime de repartição simples. Os contínuos resultados negativos da seguridade social da União cresceram devida à insuficiência de receita disponível posta à sua disposição para executar o que está previsto na Constituição de 1988. Os orçamentos fiscais são rígidos devido às regras de vinculação constitucionais.

O expediente básico usado pela política fiscal tem sido corte constante de gastos públicos e a elevação da carga tributária em todos nos níveis de governo. Governos subnacionais relevantes quase entraram em default para cumprir os acordos de dívida e acumulam passivos insustentáveis. A partir de 2014, várias leis complementares de refinanciamentos foram aprovadas e o problema, ainda, permanecerá por mais 10 anos ou mais.

Em resumo, tudo o que está dito acima já foi escrito e reescrito. No entanto, a mídia e o mercado continuam presos ao esquema teórico conservador, cujo resultado tem custado décadas de baixo crescimento. A independência do Banco Central, recentemente aprovada, foi um marco importante no processo de fortalecimento das decisões de política monetária, não podendo ser entendida como uma captura pelo mercado financeiro. Numa agenda modernizadora, poderia ser levada adiante a proposição de depósitos remunerados no Bacen e a paulatina redefinição do uso das operações compromissadas.

Fundamentalmente, caberia ao governo central e ao Bacen encontrar uma solução ótima entre a pressão do mercado financeiro em torno da taxa básica de juros no Brasil e a necessidade premente dos governos reduzirem seus passivos. A inflação poderia resolver o problema desses passivos, mas tem um custo social muito elevado para os mais pobres.

Os investidores não compram títulos públicos de governos com risco fiscal elevado. Contudo, a estrutura de juros no Brasil precisa estar em sintonia com a sustentabilidade da dívida pública. Os melhores quadros e executivos atuam na autoridade monetária, cabendo a eles indicarem um novo caminho, além do regime de metas de inflação, que esteja em sintonia com o papel assumido pelos bancos centrais no mundo. O governo Biden parece estar redefinindo um novo papel para a política fiscal, sendo que seus resultados serão avaliados com o passar do tempo.

Artigo de autoria do economista, auditor-fiscal aposentado da Secretaria da Fazenda do RS, Roberto Balau Calazans, publicado no blog "FinançasRS". Para acessar o artigo CLIQUE AQUI

 

Como o Governo do Estado do RS colocou em dia a folha de pagamento de seus servidores

A colocação da folha em dia, depois de mais de quatro anos de atraso, tem dado lugar às mais diversas interpretações, muitas totalmente equivocadas.

Em primeiro lugar, esse é um objetivo que vem sendo perseguido desde o governo Sartori, que deu início a esse atraso, procurou eliminá-lo aumentando impostos, fazendo reformas, suspendendo o pagamento da dívida e tentando aderir ao Regime Recuperação Fiscal.

É preciso que se diga que a crise histórica das finanças, que vem de décadas, foi agravada ultimamente por dois motivos: o crescimento da folha de pagamento, que passou de R$ 13,4 bilhões em 2010 para R$ 29,2 bilhões em 2018, num incremento de duas vezes a inflação e 1,5 vezes o crescimento da receita. Embora esse crescimento se verificasse em oito anos, ele foi gerado nos primeiros quatro (2011-2014). Para agravar mais a situação, entre 2015 e 2018, a receita corrente líquida cresceu apenas 0,5% ao ano em termos reais.

O governo atual, que assumiu em meio a essa crise, ainda teve sua receita reduzida substancialmente entre março e julho de 2020, quando recebeu ajuda federal para aplicar em saúde e para livre aplicação. A suspensão das prestações da dívida não foi sentida por nosso Estado, porque já fazia desde julho/2017, por força de medida liminar. Recebeu também benefício no tocante à dívida com credores multilaterais.


Além disso, foi beneficiado pelas vedações ao aumento de despesa, impostas pela mesma lei complementar que autorizou os recursos, a LC 173/020. Esse fato, acompanhado da receita que passou a crescer a partir de julho de 2020, mais a ajuda federal, geraram grandes superávits em todos os estados, permanecendo em déficit somente RS e MG, mas com grande redução.


Além disso, o governo atual fez reformas profundas na previdência e nos quadros de pessoal, que terão grande efeitos com o passar do tempo. No curto prazo, no entanto, o maior efeito se verificou no aumento das contribuições previdenciárias.


Pode se dizer que os recursos federais tiveram grande influência no pagamento da folha, porque supriram com vantagem as perdas ocorridas, mas o Estado o utilizou a parcela que veio para aplicar em saúde na sua verdadeira finalidade, a saúde. Recebeu no total, em torno de R$ 3 bilhões, nada tendo a ver com as somas estratosféricas de que se ouve falar. Quem quiser entender melhor o assunto, disponibilizo a apresentação em causa.

Artigo de autoria do economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas e conselheiro do Corecon-RS, publicado no Blog FinançasRS, em 05 de maio de 2021. Leia aqui

 

Interrupção nas pesquisas do IBGE



Não há dúvida sobre a importância do papel que desempenha o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para o país. Trata-se da principal fonte de informações oficiais que instrumentaliza estudos científicos e planejamento de ações públicas.

A informação de qualidade é uma das formas de obtenção de conhecimento que se adquire no momento certo, visando correções, adequações ou vantagens competitivas em todas as nossas ações, sejam públicas ou privadas.O último censo realizado pelo IBGE ocorreu em 2010 e deveria ser atualizado em 2020, mas em função da pandemia foi prorrogado para 2021.

Com alegações de falta de recursos financeiros o governo anuncia que não haverá pesquisas que retratam as características da sociedade brasileira, de sua economia e condições de vida, o que nos ofereceria um panorama completo da sua evolução ao longo do tempo. Como pesquisador e usuário das informações do IBGE na maioria dos estudos que realizei e continuo realizando, mesmo depois de aposentado, lamento profundamente esta quebra de sequência das informações, altamente prejudicial a quem depende delas para projeções e tomada de decisão.

O mundo está acelerado, a economia mudou, os trabalhos convencionais tendem a acabar e as mudanças que iremos vivenciar daqui para frente serão ainda maiores e mais rápidas. Há dez anos assistimos ao primeiro vídeo no Youtube, hoje o Youtube tem mais de um bilhão de usuários. Há dez anos surge o Facebook começando dentro de uma universidade. Hoje, o Facebook tem 1,4 bilhão de usuários e está presente em quase todos os países do mundo. Há dez anos havia 6,4 bilhões de seres humanos na terra e apenas um bilhão estavam on-line. Hoje há 7,4 bilhões e três bilhões tem acesso à internet, sendo mais de 120 milhões aqui no Brasil. Há dez anos não existia Uber ou AirBnb, hoje muita gente deixou o carro de lado em função das facilidades dos novas opções de transporte e tem optado por locações temporárias nas cidades ou nas praias.

Conhecer todas estas informações e outras tantas contidas nos dados do IBGE permitem o melhor planejamento nos investimentos de infraestrutura necessários ao bem estar da população. Saber em que nível tudo isto está acontecendo no Brasil é uma questão de sobrevivência das pessoas comuns, dos estudantes, dos pesquisadores, dos governantes e dos investidores. Em dez ou onze anos muita coisa já mudou, a nossa fotografia passada já não retrata o que somos o que pensamos e o que desejamos ser. Sem estas informações o setor público não terá condições de planejar ações de impacto sobre a sociedade, o setor privado terá dificuldades de prospectar potenciais clientes e consumidores e a comunidade científica e estudantes não encontrarão informações que lhes respaldem na multiplicação de conhecimentos nas mais variadas áreas do saber.

Como nação em desenvolvimento, que enfrenta uma situação inusitada, onde os recursos financeiros são escassos e as demandas essenciais são prioritárias, entendo que o conhecimento do que somos, neste momento, também é importante para o nosso futuro e deveria merecer atenção do governo.

Artigo de autoria do economista João Carlos M. Madail, Conselheiro do Corecon-RS e Diretor da ACP - Pelotas, publicado no Diário Popular de Pelotas, edição do dia 30 de abril de 2021.

Quebra das empresas na pandemia

Quem nunca pensou em ter o seu próprio negócio, ser patrão e comandar pessoas com o objetivo de produzir algo de interesse para alguém e com isso ganhar dinheiro. São comuns alguns iniciantes a empresários utilizarem conhecimentos empíricos para iniciar o negócio, outros se valem de ajuda técnica como forma de reduzir riscos de insucesso, muito comum nos primeiros anos de existência da empresa. O ideal é combinar os conhecimentos empíricos com os especializados, mesmo que esta tomada de decisão não garanta segurança total para a sobrevivência do negócio. Enquanto o cenário é favorável com a economia aquecida fica mais fácil administrar uma empresa da forma estabelecida, no entanto quando acontecem mudanças inesperadas, náo previstas na estratégia inicial, projetada pelo administrador, as coisas se tornam difíceis e podem destruir o sonho do cidadão empresário. São vários os motivos que levam uma empresa a quebrar, o principal deles é a falta de dinheiro para atender os compromissos assumidos e manter a família do empresário com a renda projetada.

A pandemia não estava contida nos planos de manutenção e crescimento das empresas e pegou de surpresa a todos, especialmente as empresas inseridas no ramo dos produtos não essenciais. Trata-se de um novo cenário que bagunçou a vida de todos os indivíduos, isolando consumidores de empresários que permanecem na maior parte do tempo em casa, recalculando gastos e destinando o mínimo necessário para os produtos essenciais à sobrevivência da família. Mesmo que os empresários tenham mudado as suas estratégias de venda, não tem sido fácil convencer os clientes a adquirir os seus produtos, fazendo com que revejam as suas ideias de manter o negócio ativo.

O governo tem sinalizado com ajuda financeira aos empresários, mas em muitos casos, para uns esta ajuda demorou em chegar e para outros é insuficiente para manter o negócio. As companhias aéreas foram as primeiras a demonstrar fraquezas, empresas de turismo ou de viagens corporativas, assim como varejistas com fraca presença no e-commerce, também estão na lista dos quebrados. Portanto não foi somente a lojinha da esquina que está passando por apuros, os grandes também. As estatísticas publicadas mostram que de cada 10 empresas que fecharam no país, quatro foram afetadas pela pandemia. No país inteiro, na primeira quinzena de 2021 fecharam 1,3 milhão de empresas e tudo leva a crer que o processo de fechamento continue. É flagrante também em Pelotas o número de empresas que já fecharam as portas, despediram funcionários em função do desaparecimento de clientes. Apenas aquelas que trabalham com produtos ou serviços essenciais continuam ativas, mas com quedas nas vendas. Enfim, a pandemia acabou com o sonho de muita gente de ter o seu próprio negócio e contribuir com empregos e impostos na movimentação da economia. A retomada dos negócios, ainda sem previsão muito clara, demandará um preço caro para os empreendedores e muita criatividade para recomeçar do zero, considerando a pobreza estabelecida nas camadas mais numerosas da população que, em geral, é a que mais consome. A vacinação para todos é um grande alento para a retomada da vida e dos negócios, com a oportunidade de olhar de outra forma para si, para o outro e para a cidade.

Artigo, de autoria do economista João Carlos M. Madail, Conselheiro do Corecon-RS e Diretor da ACP - Pelotas, publicado no Diário Popular de Pelotas, edição do dia 15 de abril de 2021.

As finanças públicas dos Entes Subnacionais e os desafios em meio à pandemia

 

As finanças públicas dos estados e municípios já apresentavam deterioração muito antes da Covid-19. E agora, quais são os principais desafios a serem enfrentados pelos governadores e prefeitos durante a pandemia?

O Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais[1] (BFES)[2] de 2020, publicado pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) foi elaborado durante os impactos econômicos da pandemia da Covid-19. Com isso, até o momento de sua publicação, o BFES trouxe poucos ou quase nenhum reflexo, dos efeitos da pandemia na situação fiscal dos Entes Subnacionais. Porém, os impactos da pandemia na economia durante o ano de 2020, como a frustração de receitas estaduais e municipais e a elevação das despesas de saúde e assistência social, sinalizam importantes preocupações conjunturais em 2021.

Em 2020, por meio da Lei Complementar nº 178, de 27 de maio de 2020[3], que estabeleceu o Programa Federativo de Enfrentamento à Covid-19, a União transferiu em forma de auxílio financeiro aos Entes Subnacionais, o valor total de R$ 60 bilhões, para aplicação em ações de saúde, assistência social e para a cobertura das perdas de ICMS e ISS em decorrência da pandemia[4].

Porém, mesmo antes do surgimento da pandemia, muitos estados e municípios estavam passando por dificuldades em suas finanças. No caso dos estados, mesmo que em 2019 o agregado das receitas primárias estaduais tenham sido superiores ao agregado das despesas primárias estaduais, o que possibilitou superávit primário pela primeira vez desde 2016 (ano da primeira publicação do BFES), muitos estados apresentaram dificuldades na obtenção de operações de crédito[5], para cobertura da sua Necessidade de Financiamento (NF).

Para compreender como se obtém a NF e a importância das operações de crédito para sua cobertura, é necessário entender o que são os resultados primários. Os resultados primários são obtidos pela diferença entre receitas primárias e as despesas primárias. As receitas primárias são formadas pelas receitas tributárias e pelas transferências governamentais, desconsiderando as receitas financeiras (juros recebidos). As despesas primárias são formadas pelas despesas sem considerar as despesas financeiras (despesa com juros). O superávit primário ocorre quando as receitas primárias são superiores às despesas primárias, enquanto que o déficit primário, surge quando as despesas primárias são superiores às receitas primárias.

A NF é calculada pelo somatório do déficit primário e as despesas financeiras líquidas (saldo resultante entre as despesas de juros menos as receitas com juros). As principais formas de financiamento para cobertura da NF dos Entes Subnacionais são a alienação de bens[6] e as operações de crédito. Na ausência dessas fontes de financiamento, não é possível a cobertura da NF, o que força os estados a postergarem os pagamentos dos fornecedores, uma vez que estados e municípios não emitem títulos da dívida pública.

Ao mesmo tempo que possuem cada vez menos bens para alienação, os Entes Subnacionais também têm encontrado dificuldades para realização de contratação de empréstimos e financiamentos, em decorrência de regras que limitam as operações de crédito. As operações de crédito realizadas pelos estados chegaram ao mais baixo patamar em 2019, em decorrência das novas regulamentações de limites impostas pela STN[7].

A STN permitiu maiores possibilidades de endividamento para estados e municípios com menor nível de endividamento, em detrimento daqueles com maior nível de endividamento, como é o caso de Estados como Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e São Paulo; e capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis, Manaus e Belém. Estas medidas resultam na impossibilidade de contratação de empréstimos e financiamentos pelos entes que apresentam problemas financeiros mais significativos.

Além do endividamento, outros critérios criaram barreiras para que estados e municípios, acessem financiamentos e empréstimos, em decorrência dos seus baixos índices de Capacidade de Pagamentos (CAPAG). O índice de CAPAG é dado pela análise do nível de endividamento, da capacidade de poupança e da liquidez dos Entes, e serve para avaliar se os Entes Subnacionais poderão ou não realizar operações de crédito com aval da União[8], reduzindo assim, a possibilidade de cobertura de suas respectivas NF.

Assim, devido à baixa capacidade de endividamento, um dos principais desafios enfrentados pelos governadores e prefeitos é preparar-se antecipadamente, para a redução de despesas no pós-pandemia, em decorrência do aumento extraordinário com as despesas em assistência social e saúde. Combinada com a redução de despesas há a necessidade de aumento da arrecadação, sem elevar a carga tributária estadual e municipal. Para tanto, será necessária maior força de fiscalização, por meio da implementação de tecnologia, voltada ao aumento da eficiência tributária. Além disso, os estados e municípios precisarão enfrentar as consequências das novas regras do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB)[9], que mesmo tendo aspectos meritórios, irão reduzir ainda mais a disponibilidade financeiras de muitos Entes Subnacionais.
Também caberá aos governadores e prefeitos, agilidade na viabilização junto das assembleias legislativas e câmaras de vereadores, da adaptação de suas previdências, conforme a Reforma da Previdência Federal[10], além de implementar em seus âmbitos, regimes de previdência complementar até o mês de novembro de 2021. Essa adaptação busca adequar as alíquotas dos regimes de previdência estadual e municipal às alíquotas de nível federal, possibilitando que haja maior fôlego financeiro, para estados e municípios, diante dos seus elevados gastos previdenciários. Isso irá garantir não só a previdência de seus servidores, mas também a manutenção das políticas públicas para toda a população.

Neste sentido, aparece como alternativa de recuperação fiscal para os estados e municípios, o Programa de Acompanhamento e Transparência Fiscal e o Plano de Promoção do Equilíbrio Fiscal, conjunto de medidas conhecidas como Plano Mansueto[11]. O Plano Mansueto tem como objetivo estabelecer um conjunto de metas e compromissos pactuados entre a União os Entes Subnacionais, para promover o equilíbrio fiscal e a melhoria das respectivas CAPAGs.

Para tanto, os estados ou municípios que desejarem aderir ao Plano, deverão estar sujeitos à determinados pré-requisitos. Dentre os pré-requisitos exigidos, os Entes Subnacionais deverão adotar medidas para a concessão, liquidação ou extinção de empresas públicas ou de economia mista, como a prestação de serviços de saneamento; a adoção de regime próprio de previdência social e de previdência complementar; reduzir em pelo menos 20% os benefícios fiscais ou financeiros fiscais, que decorram renúncia de receita; o alinhamento dos regimes jurídicos de servidores públicos estaduais e municipais aos regimes da União, para redução de benefícios ou vantagens; instituir regras e mecanismos de limitação do crescimento das despesas primárias à variação do IPCA[12]; realizar leilões de pagamento, para quitação de obrigações inscritas em restos à pagar ou inadimplidas, e a autorização para pagamento parcelado destas obrigações; e a adoção da gestão financeira centralizada no âmbito do poder executivo de cada ente, para melhor gestão dos resultados financeiros.

Finalmente, a Emenda Constitucional 109, de 15 de março de 2021[13], que possibilitou a concessão de um novo auxílio emergencial, criou também novas medidas de ajuste fiscal. Dentre essas medidas destacam-se a limitação nos gastos com o grupo de despesa de pessoal e a não criação de fundos públicos, reduzindo assim a inflexibilidade de uso dos recursos públicos. Ainda, possibilitou o uso do superávit financeiro (superávit financeiro é apurado no balanço patrimonial pela diferença entre ativo e passivo financeiro), dos fundos públicos existentes, para uso exclusivo na amortização da dívida pública. A Emenda Constitucional, envolve a desvinculação do superávit de todos os fundos, exceto àqueles voltados ao financiamento da manutenção e desenvolvimento do ensino; de ações e serviços públicos de saúde; fomento e desenvolvimento regionais; e para realização de atividades da administração tributária.

Mesmo que as soluções para os desafios técnicos possam ser sinalizadas com clareza, em termos práticos, a aplicação de tais soluções exigem mais do que pessoal com elevado nível técnico, mas também, exigirá vontade política dos gestores públicos. Os desafios políticos são muitos e irão demandar muito diálogo entre os poderes executivos e legislativos nos estados e municípios.
Como se sabe, os recursos são escassos e as necessidades ilimitadas, ainda mais diante das complexas relações que existem na gestão púbica e política brasileira. As dificuldades em aplicar uma responsável gestão financeira, entram em conflito com importantes e até legítimos interesses de manutenção de gastos públicos, ainda mais no momento da incidência de uma crise sanitária e econômica, com grande relevância histórica e ainda, infelizmente, sem data para acabar.

[1] Os Entes Subnacionais são os entes que formam a divisão político-administrativa do Brasil. Dentre eles estão os Estados Federados, o Distrito Federal e os municípios, de acordo com a redação do artigo 18, da Constituição Federal.
[2] Os dados e informações utilizados para a elaboração do artigo foram extraídos de: SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL. Boletim dos Entes Subnacionais. Disponível em < https://www.tesourotransparente.gov.br/publicacoes/boletim-de-financas-dos-entes-subnacionais/2020/114?ano_selecionado=2020> Acesso em: 20. 02. 2021.
[3] Para ver as regras na distribuição dos recursos, ver: DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO. Lei Complementar nº 173, de 27 de maio de 2020. Disponível em < https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-complementar-n-173-de-27-de-maio-de-2020-258915168> Acesso em: 03. 03. 2021.
[4] As perdas foram estimadas com base nos meses de duração da pandemia em 2020, apuradas por meio da comparação das receitas realizadas dos mesmos meses de 2019. O ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) em nível estadual e o ISS ou ISSQN (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza), em nível municipal. Ver: CÂMARA DOS DEPUTADOS. Estudo Técnico nº 24/2020. Disponível em <https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/estudos/2020/est-00782-2020-estudo-tecnico-24_2020-lc-173-subst-plp-149_04_08/view> Acesso em: 03. 03. 2021.
[5] As operações de crédito são a contratação de empréstimos ou financiamentos, para o financiamento políticas públicas, podendo ter origem interna ou externa.
[6] A alienação de bens é quando a administração pública realiza a venda de bens públicos para terceiros.
[7] SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL. Portaria nº 658, de 28 de setembro de 2019. Disponível em: https://www.in.gov.br/web/dou/-/portaria-n-658-de-28-de-setembro-de-2019-218825328> Acesso em: 20. 02. 2021.
[8] Ver nota 1 e: SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL. Capacidade de Pagamento (CAPAG). Disponível em < https://www.tesourotransparente.gov.br/temas/estados-e-municipios/capacidade-de-pagamento-capag> Acesso em: 20. 02. 2021. As operações de crédito que exigem aval da União são aquelas contraídas no exterior.
[9] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Emenda Constitucional nº 108, de 26 de agosto de 2020. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc108.htm.> Acesso em: 20. 02. 2021.
[10] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Emenda Constitucional nº 103, de 12 de novembro de 2019. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc103.htm#:~:text=Altera%20o%20sistema%20de%20previd%C3%AAncia,Art.> Acesso em: 20. 02. 2021.
[11] Estabelecido pela Lei Complementar nº 178, de 13 de janeiro de 2021, o Plano Mansueto foi como ficaram conhecidos o Programa de Acompanhamento e Transparência Fiscal e o Plano de Promoção Fiscal, devido ao seu autor, o secretário da STN, Mansueto Almeida. Para saber mais acesse: PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Emenda Constitucional nº 103, de 12 de novembro de 2019. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp178.htm.> Acesso em: 27. 02. 2021.
[12] Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo.
[13] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Emenda Constitucional nº 109, de 15 de março de 2021. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc108.htm.> Acesso em: 20. 03. 2021.

Artigo, de autoria do economista Mário de Lima, professor universitário, Assessor Econômico da SMFPA, Presidente do Corecon-RS, publicado no site Economistas no Debate.

Lições do coronavírus para a humanidade

Não há dúvida de que o coronavírus, de uma hora para a outra, transformou a vida das pessoas que habitam o planeta terra. Mesmo que o verdadeiro problema criado pela Covid seja o colapso da economia dos países, o que não foi o caso da China e índia que constataram seus PIBs crescerem na pandemia entre os 48 maiores países do mundo, provando as suas capacidades de desenvolvimento em benefício das duas maiores populações do planeta; China com 1,3 bilhões e Índia com 1,1 bilhão de habitantes. Por outro lado, do ponto de vista das relações internacionais e econômicas, há previsões de que o mundo nunca mais será o mesmo. Segundo uma previsão otimista, a necessidade óbvia da participação do Estado no enfrentamento da atual crise – caso inclusive de países neoliberais como o Brasil – aponte para um mundo em que o Estado voltará a ser protagonista e os governos mais propensos ao social.

Não há dúvida que a crise que se vive em 2021, com os conflitos, as mudanças climáticas e a Covid-19 será a maior desde a 2ª guerra mundial. Pensou-se que as guerras como efeito de problemas, políticos ou religiosos cessariam com a pandemia o que seria uma ótima razão para a volta da paz entre as nações. Mesmo que se torça para que os atos de guerra, neste momento, possam ser paralisados, pois o inimigo agora é o vírus e não os humanos que vivem em milhões nas zonas de conflito, não tem sido esta a realidade e os protagonistas sanguinários ignoram a existência da pandemia. Nos últimos nove anos vários países estão em guerra como a Síria, o Afeganistão, e vários outros, sendo devastado e ainda contaminado pela Covid-19, o que agrava a situação. Nesse contexto, a situação piorou no Iêmen, país do Oriente Médio que há quatro anos é devastado o que parece não preocupar os dirigentes com a pandemia e se joga na luta mesmo vivendo a triste realidade da destruição dos seus hospitais por bombas onde 80% da população clamam por ajuda humanitária para continuar sobrevivendo. Certamente a pandemia e a guerra destruirão o país por inteiro em pouco tempo. Na Síria não é diferente, os conflitos tem resultado em milhares de mortos, ignorando os que agonizam com a pandemia. Outros países envolvidos em conflitos parece estarem dispostos a interromper os combates, como no caso de Camarões, República Centro-africana, na Colômbia, na Líbia, em Mianmar, nas Filipinas, no Sudão do Sul, na Síria, na Ucrânia e no Iêmen. Existe, neste momento, uma boa oportunidade para a paz, mas os humanos insistem em desconhecer o verdadeiro inimigo.

A tempestade da Covid-19 ultrapassou as fronteiras dos países, independente de estar ou não em conflito, mostrando sua força superior aos canhões ou misseis utilizados nos conflitos, atingindo as populações já fragilizadas pelos horrores das guerras. Ainda há tempo para os sanguinários dirigentes dos conflitos mundiais entenderem que o atual inimigo da humanidade não é o seu semelhante, mas a COVID-19, e é contra ela que o mundo deve voltar as suas atenções, unir seus conhecimentos científicos, produzir antígenos, capaz de erradicá-la de vez.

Artigo, de autoria do economista João Carlos M. Madail, Conselheiro do Corecon-RS e Diretor da ACP - Pelotas, publicado no Diário Popular de Pelotas, edição do dia 09 de abril de 2021.

Reforma da previdência de Porto Alegre: uma necessidade

A Emenda Constitucional n° 103/2019, que alterou o sistema da previdência social brasileiro, deixou para estados e municípios a competência para legislarem sobre muitas de suas próprias regras. E isso vem causando grandes dificuldades, como o que está ocorrendo em Porto Alegre.

As mudanças na previdência deixam evidentes aquela metáfora muito usada em economia: “o que é bom para a árvore nem sempre o é para a floresta”.

Para as pessoas, individualmente, o bom seria pagar uma contribuição reduzida e aposentarem-se cedo, com remuneração integral, mantendo a paridade com os servidores da ativa. Esse sistema é o que existe ou existia até pouco tempo, mas vem gradativamente sendo alterado, por ser incompatível com os orçamentos públicos.

As receitas públicas encontram limite no crescimento do PIB, cujas taxas vêm apresentando incrementos reduzidos, pelo baixo crescimento populacional e a diminuta produtividade das economias.

Os sistemas de repartição ainda predominantes apresentam um problema estrutural que se acentua a cada ano, que é a redução no número de contribuintes para o de beneficiários. No Estado do RS, por exemplo, baixou de 4 por 1 da década de 1970, para menos de 0,7 por 1, atualmente. A expectativa de vida aos 60 anos passou de 15 anos na década de 1980 para 22 anos atualmente, e continua crescendo.

A criação do regime de capitalização a partir de uma data de corte, como fez a nossa Capital e, posteriormente, a aposentadoria complementar, são as alternativas corretas, mas apresentam um alto custo de transição. Por exemplo, em 2020 foram despendidos a títulos de benefícios e contribuição patronal para os dois sistemas mais de R$ 1,4 bilhão ou 22% da receita corrente líquida e, só não foi maior pelas medidas tomadas em nível federal de combate ao coronavírus, com o congelamento da folha até o final do corrente exercício e as transferências de recursos.

O poder público tem uma demanda crescente de serviços na educação, na saúde em outras áreas, e não há como cobrar mais impostos da população, por razões que dispensam comentários. Do governo federal nada dá para esperar, diante da sua grave situação deficitária, que deve perdurar por vários anos ou até décadas.

Como não podemos manter constantes as regras que regulam uma realidade que constantemente varia, precisamos fazer reformas.

 

Artigo de autoria do economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas e conselheiro do Corecon-RS, publicado no Jornal do Comércio de Porto Alegre, de 25/03/2021.  Leia aqui

Como sobreviver sem emprego e renda

A descoberta do corona vírus impôs ao mundo mudanças profundas de comportamento e hábitos. O enfrentamento da pandemia, a princípio, parecia ter dia e hora para ser dominado, mas aos poucos se observou que a situação era mais grave do que se imaginava e os prognósticos foram todos reformulados e lá se vão 12 meses e a situação ainda não foi controlada. Nesse período, vários Decretos governamentais impuseram e continuam impondo restrições aos negócios, exigindo que as pessoas não circulem, fiquem em casa por longos períodos. As pessoas em casa estão protegidas, mas os negócios estão sendo impactados negativamente, levando os pequenos e médios empresários a quebradeira geral. O resultado são 14,1 milhões de desempregados no país até o primeiro trimestre de 2021. Muitas pessoas não estavam preparadas para enfrentar o desemprego, o que se justifica a primeira vista. Contudo, mesmo para essas pessoas se recomenda um pouco de calma. É preciso buscar soluções conscientes em relação ao grave momento que se vive. O desemprego apresenta muitos desafios e pode ser visto como uma oportunidade de se reinventar e, quem sabe descobrir uma atividade nova que sempre sonhou realizar e que pode lhe trazer renda e conseguir sobreviver o momento. Está cada vez mais difícil para quem busca um emprego. Emprego com carteira assinada, neste momento é coisa rara. O que se pode encontrar, contando com a sorte são trabalhos. A demanda por trabalho nunca desapareceu, o que se precisa é abrir a mente para novas possibilidades. É preciso estar atento e observar o ambiente ao redor com olhar focado na identificação das necessidades das pessoas. Em geral as pessoas estão dispostas a pagar por trabalhos que resolvam os seus problemas e que, em condições normais, não conseguiam. Em tempos de crise ou não sempre existirão problemas para serem resolvidos, basta identificá-los. O momento não requer que se escolha o que fazer, mesmo que fora do status da profissão. As crises são hábeis e até essenciais para nos retirar das zonas de conforto. Para muitas pessoas atuar em algo que nunca sonhou e pela necessidade de executá-la pode lhe trazer sofrimento, mas o resultado dirá quem foi capaz de vencer a pandemia, mantendo a renda mínima que necessitou para a sobrevivência sua e da sua família. O momento é de mudanças e mesmo que saibamos que ela existe, nunca estamos preparados para enfrenta-la. Muitas pessoas, certamente, sairão da crise construindo um grande negócio que talvez jamais tivessem realizado sem este cenário de restrições que estamos vivendo. O que não dá é para ficar parado esperando a retomada da vida normal sem prognósticos confiáveis do fim da pandemia.

Artigo de autoria do conselheiro do Corecon-RS, economista João Carlos M. Madail, publicado no Diário Popular de Pelotas, dia 22/0/21.

A Lição de Pirro

Em 279 antes de Cristo, Pirro - rei e general do Epiro - travou contra os romanos a Batalha de Ásculo e conquistou a vitória. Porém, com um elevado número de baixas de oficiais e soldados, obteve prejuízos irreparáveis para o seu exército, o que comprometeu a continuidade da guerra contra Roma. Ao observar os saldos da batalha, Pirro teria dito: “outra vitória como esta e estamos acabados”. O episódio ficou conhecido como a“Vitória de Pirro”,termo que hoje é utilizado, para descrever uma vitória com efeitos prejudiciais ao vencedor.

O episódio vivido por Pirro, explica que determinadas estratégias ou decisões que desconsideram os aspectos complexos de relações existentes entre dois problemas, poderão levar a resultados desastrosos. É o caso de ter que escolher como prioridade a saúde ou a economia, diante da pandemia da Covid-19. Ao tomar como verdade uma falsa dicotomia entre saúde e economia, os resultados serão os mesmos contabilizados por Pirro. E as baixas já são evidentes. Na economia, já se observam a quebradeira de empresas, o aumento do desemprego, o aumento do endividamento e das despesas públicas, com redução na arrecadação, elementos que pulverizam as expectativas dos investidores e comprometem o futuro da vida da população.

As baixas na saúde e na vida humana são sentidas a cada minuto, com aumento do número de infectados, internações, filas para UTI, óbitos e possíveis sequelas da doença. A única forma de garantir a sobrevivência da economia e da vida humana passapela autorresponsabilidade de cada cidadão. Enquanto se aguarda ansiosamenteo acesso às vacinas, a população deve ser mais rigorosa com os cuidados, para reduzir a transmissão da doença. Da mesma forma, os setores econômicos devem colaborar no processo educativo da população, com o poder público realizando o máximo de esforços, para manter a atividade econômica, de uma forma que garanta e preserve a saúde das pessoas.Esta é a lição de Pirro: é mais importante vencer a Guerra, do que uma batalha.

Artigo de autoria do presidente do Corecon-RS, economista Mário de Lima, publicado na edição de sábado, dia 13 de março de 2021, do Jornal Zero Hora.

Desvalorização do real e suas consequências

 O preço da economia está alicerçado na taxa de câmbio e na taxa de juros. A taxa de câmbio representa o valor da moeda de um país em relação às demais moedas vigentes no mundo. O Real tem se desvalorização o que significa o enfraquecimento da economia brasileira, abrindo espaço para o crescimento da inflação, pois uma moeda fraca compromete todos os preços da economia que inclui desde medicamentos, até os alimentos e demais segmentos transacionados em dólar. Um exemplo desta afirmação está ocorrendo com a gasolina já que o petróleo é cotado em dólar. As empresas que operam com produtos importados têm os seus crescimentos comprometidos. O Brasil optou pelo sistema de câmbio flutuante, mas poderia ter optado pela taxa de câmbio fixa ou pela taxa de câmbio atrelada, sendo que cada uma das situações possui características diferentes e gera resultados distintos.

O sistema de câmbio flutuante adotado pelo Brasil é o mesmo adotado pela maioria dos países. Nesse sistema cambial o Banco Central define apenas a política monetária, ou seja, controla a taxa básica de juros e a base monetária. Assim a taxa de câmbio varia diariamente, dependendo da oferta de moeda estrangeira, da demanda de estrangeiros pela moeda nacional e, principalmente do humor dos investidores estrangeiros e dos especuladores em relação à situação econômica e política do país. Nesse cenário, a taxa de câmbio é um preço formado instantaneamente pela interação voluntária de bilhões de agentes econômicos que circulam no mundo. Esses agentes referidos, que acompanham o dia a dia das economias dos países, observam a perspectiva de inflação de preços, de um determinado país, a sua situação política e econômica, qual o futuro de sua moeda em relação a valorização ou desvalorização.

O que está ocorrendo no Brasil é uma fuga de capitais estrangeiros causados, pelo enfraquecimento da economia, aliado a polarização política que tem gerado desconfiança e insegurança para o mundo financeiro, refletindo diretamente na desvalorização do real e dificultando as importações, mesmo que estimule as exportações. Entende-se que a taxa de câmbio flutuante não funciona muito bem para os países ainda em desenvolvimento que necessitam de certa estabilidade monetária ou politica. Mesmo para os exportadores não há o estímulo esperado, visto que a inflação de preços resultante da disparada cambial afeta diretamente os custos do setor industrial ou agrícola que necessita importar insumos e maquinários indispensáveis as suas atividades. Na prática qualquer sinal de instabilidade, a taxa de câmbio não flutua, mas afunda, levando consigo a inflação de preços e a consequente queda no padrão de vida dos cidadãos.

Artigo de autoria do conselheiro do Corecon-RS, economista João Carlos Medeiros Madail, publicado na edição de 04/03/2021, do Diário Popular de Pelotas. 

Página 13 de 21